Título: Energia nuclear pacífica
Autor: Edmilson Valentim
Fonte: Jornal do Brasil, 24/10/2005, Outras Opiniões, p. A17

Nos últimos anos, uma série de debates, acompanhados de reportagens, artigos e editoriais nos grandes veículos de comunicação, estabeleceu um amplo esclarecimento sobre a necessidade estratégica de diversificar a matriz energética do país reforçando a produção de energia nuclear através da construção da Usina Nuclear Angra III. Os governos federal e do Rio de Janeiro, com ampla participação de parlamentares fluminenses, o setor produtivo, a comunidade científica, os ambientalistas, enfim, a sociedade em geral, praticamente esgotaram o tema. Em que pese o atual momento político e divergências (por ingenuidade ou ''outros interesses''), não restam dúvidas quanto as conveniências econômicas e tecnológicas que representam a continuação do Programa Nuclear Brasileiro e a retomada imediata das obras de Angra III. O país não perdeu de vista que a redução dos combustíveis fósseis e as oscilações do mercado de petróleo põem como alternativa no futuro próximo a produção em grande escala de energia nuclear. Atualmente, apenas 12 países têm capacidade científica e tecnológica para projetar e construir usinas nucleares. Estados Unidos, França, Alemanha, Inglaterra, Japão e Bélgica, que baseiam 70% de suas matrizes na energia nuclear, têm capacidade cinco vezes maior de geração que a nossa. Incluindo Angra III, o Brasil terá pouco mais de 4,5% da sua matriz nuclear. O custo do urânio, o combustível das usinas, corresponde a 2% do custo de geração de eletricidade e não está sujeito às pressões do dólar, e o Brasil possui a sexta maior reserva de urânio do mundo.

Já conseguimos um grande avanço e não há como retroceder. O domínio dessa tecnologia de ponta com elevado conteúdo estratégico tem um grande significado, inclusive para as próximas gerações. Hoje, a utilização é crescente na medicina do tratamento do câncer, na indústria de transformação, nas áreas de eletrônica avançada, solventes químicos, metalurgia, ótica, informática e outras. Centenas de empresas brasileiras já recebem essa tecnologia. Dominá-la significa ampliar mercados, gerar postos de trabalho e, sobretudo, fortalecer a soberania. E o Brasil, pelo seu histórico, possui todas as credenciais para desenvolvê-la com fins pacíficos.

Há argumentos sólidos para construção de Angra III, inclusive porque Angra II sempre funcionou muito bem e é uma espécie de maquete de tamanho real de Angra III, praticamente eliminando, por isso, os riscos de construção da terceira usina. O projeto de geração em base térmica de fonte nuclear, ao contrário dos projetos termoelétricos a gás natural ou carvão, não contribuem para o aquecimento global. A usina não emite gases para a atmosfera. Angra III simplesmente vai adicionar ao sistema elétrico 1.350 MW de potência de energia mais limpa, que atende inclusive ao Protocolo de Kyoto.

Afora o aumento na geração de energia elétrica, que beneficiará o sistema interligado Sudeste/Centro-Oeste, e a ampliação da matriz energética nacional, e o estímulo à produção de urânio, estratégico para o desenvolvimento, a construção de Angra III trará ainda novos benefícios econômicos para o progresso dos municípios circunvizinhos, dentre os quais Angra dos Reis, Parati, Mangaratiba e Rio Claro, além da criação de milhares de empregos na região sul do estado.

Os temores sobre riscos de desastres nucleares diminuíram muito nos últimos anos, sobretudo em função dos cuidados de segurança, como mostram centenas de usinas em operação no mundo, sem acidentes ou danos ao meio ambiente. Todas as forças políticas institucionais comprometidas com o desenvolvimento do país consideram fundamental a conclusão de Angra III para viabilizar o programa nuclear brasileiro e assegurar o domínio da tecnologia. A Comissão Nacional de Política Energética vai além e recomenda também a construção de outras usinas nucleares. A decisão depende agora dos ministros da área econômica e do presidente.

Cerca de US$ 750 milhões já foram investidos em equipamentos importados, que estão estocados há mais de uma década e consumindo anualmente mais de US$ 20 milhões em manutenção. Então, vamos abrir mão em prol de que ''outros interesses''? O Brasil não pode perder mais tempo, sob risco de jogar todo esse dinheiro no lixo, já que os equipamentos não têm outra serventia. Esperamos sinceramente que o presidente Lula faça a opção pelo domínio da tecnologia, opção pelo futuro do país, imediatamente.