O Globo, n. 32532, 01/09/2022. Política, p. 6

TSE acena a militares e avalia novo teste nas urnas

Mariana Muniz
Jussara Soares


Na segunda reunião em nove dias entre o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, e o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira, “ficou reconhecida” a eficiência dos testes feitos nas urnas eletrônicas e ambos acertaram a possibilidade de um projeto piloto para implementação de nova etapa de testagem dos equipamentos, segundo nota divulgada pela Corte. A adoção de mais uma fase de checagem é um pleito dos militares e, segundo o GLOBO apurou, terá de ser submetida ao plenário do tribunal.

Em um gesto de conciliação, o Ministério da Defesa optou por não divulgar nota sobre a reunião com o argumento de que cabe ao TSE se manifestar sobre o sistema de votação. Segundo o colunista Lauro Jardim, Nogueira tratou como “assunto superado” ao responder a um ministro de Jair Bolsonaro que lhe perguntara sobre o resultado da reunião.

O encontro foi simbólico, pois reuniu pela segunda vez em pouco mais de uma semana Moraes, o magistrado mais atacado por Bolsonaro, e o ministro responsável pelas Forças Armadas. O sistema de votação é alvo de reiterados ataques feitos pelo titular do Palácio do Planalto, que levanta suspeitas infundadas sobre a segurança das urnas eletrônicas.

A proposta feita por representantes das Forças Armadas prevê que o novo procedimento utilize a biometria de eleitores para verificar e eficiência das urnas. Ele ocorreria por amostragem, ou seja, seria aplicado em apenas parte das máquinas. Hoje, o TSE prevê a auditoria em cerca de 650 equipamentos, mas sem a participação de eleitores reais nem com o uso do sistema de identificação biométrica.

Governo comemora

Segundo O GLOBO apurou, na reunião ficou acertado que o projeto de teste de integridade com eleitores reais neste ano só poderá ser feito em um número pequeno de seções, uma vez que amostragem maior seria inviável pelo prazo curto e a logística envolvida.

O ministro da Defesa concordou com a possibilidade e aguarda uma proposta da Corte Eleitoral sobre o número de seções que terão os testes. O presidente do TSE, segundo relatos ao GLOBO, alertou Nogueira que toda a definição ainda deverá ser submetida ao plenário. Militares, porém, afirmam que Moraes teria passado tranquilidade de que as medidas não serão vetadas pelos demais ministros.

Moraes ainda vai analisar os projetos a serem apresentados pelas áreas técnicas do tribunal e do ministério para decidir se há viabilidade. Os militares têm a expectativa, contudo, que isso ocorra antes das eleições deste ano — o primeiro turno está marcado para 2 de outubro.

Nos bastidores do governo, a sinalização de Moraes foi comemorada. Ao fim da reunião, integrantes do Palácio do Planalto disseram estar respirando aliviados. A avaliação é que o ministro fez um gesto de conciliação, o que, na visão deles, tende a diminuir a tensão em torno dos atos de 7 de Setembro.

Nos últimos dias, personagens do governo e da campanha à reeleição do presidente vinham demonstrando preocupação com as manifestações que estão sendo programadas para o Dia da Independência. Nos bastidores, temia se que o ambiente fosse contaminado pelos efeitos da operação da Polícia Federal, autorizada por Alexandre de Moraes, contra empresários bolsonaristas que trocaram mensagens de cunho golpista no WhatsApp.

Embora a nota do TSE não tenha sido taxativa sobre a possibilidade de se acolher, de fato, os pleitos das Forças, militares ouvidos pela reportagem classificaram a reunião como “muito satisfatória” e apontaram que houve “muita convergência em torno dos pontos técnicos.”

“A importância da manutenção da realização do Teste de Integridade, que ocorre desde 2002, como mecanismo eficaz de auditoria foi ressaltada por ambas as áreas técnicas, que apresentarão, em conjunto, a possibilidade de um projeto piloto complementar, utilizando a biometria de eleitores reais em algumas urnas indicadas para o referido teste, conforme sugestão das Forças Armadas no âmbito da Comissão de Transparência Eleitoral”, diz a nota do TSE.

O texto diz ainda que durante o encontro foi reafirmado que “haverá a divulgação de todos os BUs (Boletins de Urna) pelo TSE, possibilitando a conferência e totalização dos resultados eleitorais pelos partidos políticos e entidades independentes”.

Êxito nos testes

Ainda segundo o TSE, durante a reunião ficou reconhecido, por parte dos técnicos de ambos os lados, “o êxito dos testes de verificação das Urnas Eletrônicas, inclusive do modelo UE 2020, realizados pela USP, Unicamp e UFPE e a importância da realização de um evento público com a Comissão de Transparência Eleitoral e as entidades fiscalizadoras para a apresentação desses resultados”.

A reunião entre Moraes e Nogueira contou com a presença, por parte do TSE, do secretário de Tecnologia da Informação, Julio Valente. Por parte da Defesa, o coronel Marcelo Nogueira de Sousa, que chefiou a equipe de militares responsável pela análise dos códigos-fonte das urnas eletrônicas.

Os militares vinham insistindo na inclusão de mais uma etapa de testagem das urnas e submetê-las a esses procedimentos já nas seções eleitorais e não nas sedes dos tribunais regionais eleitorais, como ocorre hoje em dia. Os militares argumentam que o teste proposto não implica em transtorno para o eleitor, assim como não viola o sigilo do voto e não tem correlação com o voto impresso.