Título: 2.000 razões para voltar
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Fonte: Jornal do Brasil, 26/10/2005, Internacional, p. A7

Baixas americanas no Iraque renovam crescente pressão para a retirada

BAGDÁ - No dia em que Bagdá anunciou oficialmente ter aprovado, com 78% dos votos, a sua nova Constituição, os Estados Unidos se lembraram que o preço para a implantação de seus interesses no país árabe é alto. Passaram de 2 mil os soldados americanos mortos no Iraque desde a invasão, em março de 2003, de acordo com números do Pentágono. Os feridos já somam 15 mil.

À tarde, o Exército confirmou a morte de mais dois fuzileiros em um ataque de carro-bomba, na sexta-feira, perto de Amiriya, na região insurgente de Faluja (50 km a Oeste de Bagdá). Mas a ''baixa número 2.000'' é a do sargento texano George Alexander Jr. Após ser ferido em Samarra, no dia 17, foi levado de volta aos EUA. Morreu em San Antonio, em seu estado natal, na semana passada.

A quantidade de baixas, entretanto, parece não espantar o porta-voz da força americana no Iraque, tenente-coronel Steve Boylan. Ele pediu que os jornalistas que cobrem a ocupação que não tratem o número como ''um marco'':

- Pensem no efeito que vai ter nas famílias dos que servem lá. Os 2 mil mortos na Operação Liberdade não são um marco. São um ponto artificial escrito por indivíduos ou grupos com planos específicos e motivos ulteriores - afirmou. - O 2.000º soldado morto em ação é tão importante quanto o primeiro e será tão importante quanto o último que morrer nesta guerra contra o terrorismo para garantir a liberdade a um povo que não conheceu a liberdade por duas gerações.

No entanto, uma pesquisa do Harris Interactive mostra que o discurso ''de solidariedade com os oprimidos'' já não encontra tanto respaldo entre os americanos: 53% dos entrevistados consideram a guerra ao Iraque ''um erro'' e apenas 34% continuam apoiando-a. É a primeira vez que a maioria do povo dos EUA está contra a guerra. A sondagem, difundida antes do anúncio do Pentágono, ressalta ainda que 44% acredita que a situação está ''piorando'' para os soldados americanos no Iraque, contra 19% que acham o contrário.

Mesmo com queda nos índices de popularidade e no apoio civil à guerra do Iraque, o presidente Bush reafirmou ontem que o número de baixas não é motivo para trazer os soldados de volta. Ainda: a guerra vai requerer mais tempo e abnegação.

- Cada perda parte nosso coração. Mas a melhor maneira de honrar o sacrifício dos soldados mortos é completar a missão e estabelecer a fundação de uma paz que espalhe a liberdade - discursou, com a voz embargada, em um almoço com mulheres de militares, na Base Aérea de Bolling, em Washington. - Os terroristas são os inimigos mais brutais que já enfrentamos.

Enquanto isso, Cindy Sheehan - mãe de um soldado morto no Iraque e que se tornou uma das vozes mais contundentes a favor da retirada das tropas - avisava, em frente à Casa Branca, que planeja retomar os protestos. E não está sozinha. O senador democrata Patrick Leahy deu vazão à impaciência popular e acusou Bush de ignorar as lições da Guerra do Vietnã:

- Minha pergunta para as autoridades é: Quando e como vocês vão nos retirar dessa bagunça?

O argumento do presidente para a política de ''manter o curso'' é que o Iraque está progredindo e que um retorno estaria mais próximo: aprovou a Carta que abre caminho para a eleição de um novo governo em dezembro e as tropas iraquianas, treinadas pelos americanos, cada vez assumem mais a responsabilidade por combater a insurgência sunita. Além disso, sustenta que os EUA e outras nações serão menos seguras se os líderes da Al Qaeda, Osama bin Laden, e seu lugar-tentente no Iraque, Abu Musab al Zarqawi, se aproveitarem da retirada americana ou da instabilidade política de Bagdá para tomar o controle do país.

Mas Leahy exige um prazo:

- Uma vez que um novo governo do Iraque tome posse, Bush deve consultar o Congresso sobre um plano que inclua recolher os soldados das áreas mais populosas, onde o Exército sofre mais baixas. E então, trazê-los de volta.