O Globo, n. 32533, 02/09/2022. Política, p. 4
Disputa esticada
Bernardo Mello
Após o primeiro debate de candidatos à Presidência e das sabatinas realizadas pelo Jornal Nacional, pesquisa divulgada ontem pelo Datafolha indicou redução da possibilidade de uma eleição decidida em primeiro turno. O levantamento, contratado pela TV Globo e pelo jornal Folha de S. Paulo, apontou oscilação negativa do ex-presidente Lula (PT), que aparece agora com 45%, ante 47% na pesquisa anterior — variação dentro da margem de erro, que é de dois pontos. Embora o presidente Jair Bolsonaro (PL) tenha se mantido estagnado na segunda colocação, com os mesmos 32% registrados no levantamento do último dia 18, Ciro Gomes (PDT), Simone Tebet (MDB) e Soraya Thronicke (União) obtiveram números superiores aos seus desempenhos na última pesquisa. Com isso, o petista, que aparecia com 51% dos votos válidos — quando são desconsideros brancos, nulos e indecisos —, agora tem 48%.
Enquanto Ciro oscilou dois pontos para cima, chegando a 9%, Tebet foi a única a avançar acima da margem de erro. A candidata do MDB passou de 2% para 5%. Se no último levantamento apenas cinco candidatos haviam pontuado, desta vez sete nomes atingiram 1% — percentual de Soraya Thronicke (União), Felipe D’Avila (Novo) e Pablo Marçal (PROS) — ou mais das intenções de voto. Esta é a primeira vez desde maio que o desempenho de outros candidatos, somados, fica numericamente acima do percentual de Lula: 49% a 45%. O Datafolha entrevistou 5.734 pessoas entre terça-feira e ontem.
A melhora no desempenho de candidatos da chamada “terceira via” coincidiu com o início do horário eleitoral em rádio e TV e, nos casos de Ciro e Tebet, com a participação tanto na sabatina do Jornal Nacional quanto no debate. Entre os candidatos que pontuaram, apenas Marçal não apareceu em nenhum desses eventos. Ele foi retirado da disputa presidencial pelo próprio partido, embora seu nome tenha figurado no questionário do Datafolha, por ter registrado candidatura.
O resultado da pesquisa indica um revés momentâneo na estratégia de Lula, que tentou atrair apoios na pré-campanha de partidos como MDB, União Brasil e PSD de olho em uma vitória no primeiro turno, além de ter feito acenos para eleitores de Ciro Gomes no último debate e de ter conseguido tirar da disputa o deputado André Janones (Avante). Também frustra a campanha de Bolsonaro, que esperava manter-se avançando nas pesquisas a reboque da ampliação do Auxílio Brasil e da redução do preço dos combustíveis. O desempenho do presidente no início da campanha eleitoral, com 32%, havia sido três pontos superior ao que ele registrava em julho, segundo o Datafolha. Lula, por sua vez, vinha marcando 47% nos últimos três meses.
Eleitor mais pobre
Na pesquisa anterior, divulgada em agosto, Lula obteve seus melhores desempenhos no eleitorado mais pobre, com 55% — este grupo, com renda familiar mensal de até dois salários mínimos, é o principal componente do Cadastro Único (CadÚnico) de programas sociais do governo federal. Bolsonaro, por sua vez, apresentava no estrato seu menor patamar de intenções de voto naquele levantamento, com 23%. Os números de ontem do Datafolha mostram que, em que pesem oscilações, o petista segue com mais que o dobro do percentual de Bolsonaro entre os mais pobres: 54% a 25%.
A sondagem anterior havia sido realizada já após a elevação do benefício mínimo do Auxílio Brasil para R$ 600, uma das principais apostas da campanha de Bolsonaro para melhorar seu desempenho em pesquisas.
Bolsonaro, por sua vez, manteve sua vantagem para Lula na faixa de renda de dois a cinco salários mínimos, segundo o Datafolha. O presidente figura com 40% no grupo, contra 36% do petista. Trata-se de um comportamento distinto ao registrado pela pesquisa Ipec divulgada na segunda-feira, que apontou evolução de Lula nesta faixa de remuneração intermediária, ante um recuo de Bolsonaro. As pesquisas foram realizadas em datas diferentes e têm metodologias distintas. No quadro geral, por outro lado, o Ipec já havia apontado menor possibilidade de definição da corrida presidencial em primeiro turno, mesma tendência indicada pelo Datafolha de ontem.
Bolsonaro, apesar de poucas alterações em grupos que compõem suas principais fontes de apoio, como os evangélicos, passou de 32% para 35% na região Sudeste, que é decisiva para a corrida ao Palácio do Planalto por concentrar quatro em cada dez eleitores do país. Lula, por sua vez, recuou na mesma medida, passando de 44% para 41%.
A pesquisa divulgada ontem também apontou a continuidade da tendência de melhora na avaliação do governo. Segundo o Datafolha, 31% disseram considerar a gestão do atual presidente como ótima ou boa, enquanto 42% a avaliaram como ruim ou péssima. A diferença entre um e outro, de 11 pontos, é ligeiramente menor aos 13 pontos registrados em agosto, mas representa evolução ainda maior ante os 21 pontos registrados em junho, quando 47% reprovavam e 26% aprovavam o governo.
Jovens e idosos
Tebet e Ciro melhoraram seus desempenhos entre eleitores com ensino superior. O pedetista passou de 11% para 13%, enquanto a candidata do MDB passou de 3% para 7%. Ciro também evoluiu entre os mais jovens, com 16 a 24 anos, passando de 8% para 15%. Tebet, por sua vez, vê seu desempenho crescer entre os mais velhos, e atingiu 7% no eleitorado com 60 anos ou mais.