Correio Braziliense, n. 21812, 05/11/2022. Política, p. 2

Orçamento secreto será julgado na quarta

Susano Almeida


A presidente do Supremo Tribunal Federal, ministra Rosa Weber, agendou, para a próxima quarta-feira, o julgamento sobre a constitucionalidade da execução das chamadas emendas de relator, também conhecidas como orçamento secreto. A decisão pode ter impacto direto no próximo governo do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que já havia se posicionado, durante a campanha, contrário à prática.

As emendas de relator são recursos destinados junto ao Orçamento enviado pelo Poder Executivo ao Congresso Nacional, que complementam o planejamento federal. Desde 2020, entretanto, o poder sobre essas emendas passou para os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado, que recebem pedidos dos seus pares e os acrescentam de forma impositiva, sem identificar quem solicitou e sem o controle do governo federal ao Orçamento a ser executado.

Grupos contrários ao orçamento secreto apontam que a destinação dos recursos não possui transparência, são aplicados sem planejamento de forma municipalista, além de facilitar o desvio das verbas, crimes e compra de apoio e de favores.

Na última semana, Lula amenizou as críticas à prática, mas apontou a necessidade de mudanças nas regras das emendas de relator, uma vez que o governo federal fica com os recursos bloqueados pela imposição das emendas.

“Sempre fui favorável que o deputado tenha emenda, mas é importante que ela não seja secreta. É importante que esteja dentro da programação de necessidades do governo. E que essa emenda seja liberada de acordo com os interesses do governo. Não pode continuar da forma que está”, afirma o presidente eleito.

Também na última semana, o PT de Lula anunciou apoio à reeleição do atual presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL). A propósito, foi Lira quem melhor usou o orçamento secreto durante toda a gestão do presidente Jair Bolsonaro (PL), e, agora, tem o parlamento nas mãos. Motivo que levou o futuro governo a apoiá-lo, mesmo tratando de um então aliado de primeira hora de Bolsonaro.

O julgamento

Marcado para a próxima quarta (7), o julgamento sobre a constitucionalidade do orçamento secreto parece não ter consenso quanto ao resultado. Nos bastidores, ministros do STF têm defendido uma solução dentro de um meio termo, sem a proibição completa, contudo, mais transparência.

Foi a falta de clareza que levou, inclusive, a própria presidente Rosa Weber a suspender, no ano passado, a execução de emendas em decisão monocrática, posteriormente referendada por outros ministros. Ainda assim, a certeza de uma derrubada total da lei não parece ter consenso.

O Congresso, por meio da Comissão Mista de Orçamento, atendeu, em parte, o pedido do STF sobre a transparência na divulgação da destinação dos recursos. Porém, ao consultar o sistema, é possível identificar o destino das emendas, mas não o autor da mesma, facilitando, assim, possíveis casos de corrupção. É essa transparência que deve ser julgada pelo plenário do Supremo.

Ao todo, os ministros julgaram três ações apresentadas pelo PSol, Cidadania e PSB. As siglas questionam se cabe ao Legislativo o controle do montante, tal como a sua execução, uma vez que a Constituição dá ao Executivo a atribuição de definir o destino dos recursos, o planejamento e a execução, enquanto ao Congresso Nacional cabe aprovar tal planejamento e, no máximo, realizar sugestões sobre o uso das verbas.

“O julgamento do orçamento secreto pelo STF é a primeira grande possibilidade de um início de governo com menos desafios junto ao Legislativo. Para além da oposição, a captura do Orçamento pelos diversos interesses dos parlamentares, tanto individuais como de bancadas, interfere na atualidade da governabilidade, aumenta o descontrole das contas e modifica a lógica mínima da definição das políticas públicas”, aponta o advogado e analista político Melillo Dinis.

“Apesar de não saber em que pé anda a situação no STF, é muito provável que resulte na modificação do estado das coisas”, completa Dinis.