Título: Vôo direto para o encontro de contas
Autor: Rafael Rosas
Fonte: Jornal do Brasil, 27/10/2005, Economia & Negócios, p. A20

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) deu ontem a primeira indicação de que o encontro de contas entre as dívidas acumuladas pela Varig com a União e o crédito que a empresa tem a receber do governo federal pode acontecer ainda dentro do processo de recuperação judicial da companhia aérea. O assessor da presidência do banco de fomento, Sergio Varella, detalhou na assembléia de credores da Varig o plano da instituição para a reestruturação financeira da empresa e revelou que a segunda fase do projeto prevê a compensação entre o que a Varig deve à União e o que tem a receber do governo federal.

- Já estamos iniciando processo, que é da alçada dos altos poderes da República, que é uma solução absolutamente legal, transparente e juridicamente defensável para a ação do Plano Cruzado vis-a-vis o débito junto a Secretaria da Receita Federal e o INSS que a Varig tem hoje - afirmou o executivo, que evitou utilizar a expressão ''encontro de contas''.

A Varig acumula dívidas de cerca de R$ 4 bilhões com o governo, grande parte com INSS e Receita Federal, e tem a receber cerca de R$ 3 bilhões em decorrência de uma ação já transitada em julgado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) que compensa a empresa aérea em decorrência de perdas causadas pelo congelamento de tarifas desde o Plano Cruzado, em 1986, e que vigorou até o início dos anos 90. A Advocacia Geral da União ainda não recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF).

Varella ressaltou que não será o BNDES que realizará o encontro de contas. Segundo o banco, a compensação virá somente por decisão da Justiça. Varella espera que essa decisão saia a tempo de salvar a empresa.

- Estão sendo feitos esforços para resolver esta questão, que vai ser resolvida. Isso é inevitável. A Transbrasil ganhou essa causa em 1998. O que dissemos é que há esforços para que seja num prazo razoável - disse.

De acordo com o esboço do plano - que será apresentado por completo na continuação da assembléia, na segunda-feira -, a primeira fase prevê a formação de um Fundo de Investimento e Participação (FIP), constituído no Brasil, que receberia ao menos US$ 62 milhões. Os recursos do FIP seriam transferidos para uma Sociedade de Propósito Específico (SPE), que por sua vez controlaria a VarigLog e a Varig Engenharia e Manutenção (VEM).

O dinheiro conseguido com a alienação destes ativos - que estará sujeita a auditoria que avaliará o valor exato das duas empresas em até 90 dias - será depositado em uma conta vinculada, com destinação específica para o pagamento das empresas de leasing de aeronaves. Na segunda fase, aconteceria o encontro de contas.

- Depois disso, a Varig saneada se tornará atraente e estará pronta para ter um novo dono - resumiu Varella.

Para a definição sobre o novo controlador, haverá a formação de um FIP 2 após o encontro de contas, onde os donos de VarigLog e VEM terão o direito de entrar com estes ativos, que serviriam de aporte e manteriam o Grupo Varig inteiro.

Na assembléia de credores de ontem, o BNDES conseguiu aprovar a criação do FIP 1 e da SPE, a autorização para formar a conta vinculada e o sinal verde para vender VarigLog e VEM. Os demais pontos da estratégia do banco serão apreciados pelo plenário da assembléia na segunda-feira, em um plano que será aditado a um dos três já apresentados por interessados em participar da recuperação.

Para o presidente da Varig, Omar Carneiro da Cunha, a aprovação das medidas apresentadas pelo BNDES garante a sobrevivência da empresa além de 9 de novembro, quando haverá nova audiência com o juiz Robert Drain, da Corte de Falências de Nova York.

- Se este passo não tivesse sido aprovado, realmente a companhia ficaria em situação extremamente delicada. Foi importante, foi aprovada pelas três classes e agora nós vamos ter que trabalhar rapidamente para voltarmos à corte no Brasil e à corte nos EUA e apresentarmos as soluções que a Varig precisa no curto prazo - afirmou.

Na última segunda-feira, Drain prorrogou até o dia 9 de novembro a liminar que protege as aeronaves da Varig contra pedidos de arresto por falta de pagamento de parcelas de leasing. Segundo executivos da própria empresa, entre 20 e 40 aeronaves podem ser arrestadas caso o juiz americano retire a proteção da Varig, cuja frota soma 76 aviões.

- Se não houver solução no dia 9, com propostas completas e posição clara, vamos perder aeronaves - acrescentou o presidente da Varig.

Ainda ontem, a Transbrasil divulgou nota em que retira o pedido de entrada em recuperação judicial e anuncia que vai voltar a voar, embora não revele quando, nem em que rotas.