Título: MST faz a festa com dinheiro público
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Fonte: Jornal do Brasil, 29/10/2005, País, p. A7

TCU aponta desvios de R$ 15 milhões em contratos com o governo federal. Verba foi usada até em comemoração

Folhapress

BRASÍLIA - O Tribunal de Contas da União (TCU) apontou irregularidades na execução de R$ 15 milhões em convênios assinados entre ministérios e secretarias do governo federal e cooperativas ligadas ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), a Associação Nacional de Cooperação Agrícola (Anca) e Confederação das Cooperativas de Reforma Agrária do Brasil (Concrab). De acordo com o TCU, recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação foram utilizados para ''comemoração de 20 anos do MST''.

Os técnicos pedem que os recursos sejam devolvidos, caso as entidades não apresentem defesa justificada e em tempo hábil.

A auditoria, divulgada ontem pelo presidente da CPI da Terra, Álvaro Dias (PSDB-PR), sugere a realização de audiências, para que expliquem ''graves infrações à norma legal'', com os ex-ministros Tarso Genro (Educação), José Sarney Filho (Meio Ambiente) e Roberto Amaral (Ciência e Tecnologia), além do atual presidente do Incra, Rolf Hackbart, do ex-presidente do órgão, Sebastião Azevedo.

A maior parte das irregularidades refere-se ao gasto de recursos com objetivos diferentes dos aprovados no convênio e a não comprovação de gastos, além da celebração de convênios com objetos incompatíveis com os programas e ações governamentais previstos nos créditos orçamentários e ''indícios de fraudes em documentos comprobatórios de despesas''.

O texto dos técnicos do TCU indica que ''recursos orçamentários destinados ao fomento da pesca foram utilizados para realização de conferência sobre educação no campo; recursos do Fundo Nacional de Saúde, destinados ao atendimento de gestantes de alto risco, foram utilizados para realização de seminários sobre cidadania; recursos da Campanha Nacional de Documentação e da Assistência Jurídica de Assentados foram utilizados para realização de seminários sobre relações de gênero no campo; recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação foram utilizados para realização de encontro de comemoração de 20 anos do MST''. O documento será submetido à análise do TCU em 30 dias.

A auditoria também apontou falhas na execução de um convênio do Ministério da Agricultura com a Sociedade Rural Brasileira (SRB), no valor de R$ 170 mil. Segundo os técnicos do tribunal, os custos do plano de trabalho não foram comprovados.

O TCU analisou 73 convênios assinados pela União com a Anca e a Concrab entre 1998 e 2004, no valor total de R$ 32 milhões.

O convênio mais caro, no valor de R$ 5,3 milhões, foi assinado em 2004 entre o Incra e a Concrab para ''fomento da agroecologia em empresas sociais''. Atenderia 11,7 mil famílias. Mas o TCU apontou fragilidade no plano de trabalho: ''Considerando o caráter difuso do plano de trabalho, pode-se concluir que mais uma vez recursos escassos serão pulverizados em seminários, encontros e estudos, longe de atender aos interesses práticos do público-alvo, as famílias assentadas''.

Segundo a auditoria, houve ''displicência'' da Concrab na manipulação dos repasses desse convênio. ''Os extratos bancários evidenciam má-gestão dos recursos financeiros dos convênios, pela falta de aplicação ou aplicação insuficiente dos saldos disponíveis no mercado financeiro. O prejuízo, só em descuidos desse tipo na aplicação do convênio, somou R$ 45 mil.''

O TCU apontou gastos de necessidade duvidosa. O Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação entregou à Anca R$ 93,5 mil com o objetivo oficial de financiar o evento ''Estudos e discussão de temas ligados ao analfabetismo'', no Recife, dias 28 e 29 de abril de 2004, com a participação de 5.500 alunos e 200 professores. A prestação de contas revelou que o dinheiro também ajudou a bancar atos como ''comemoração dos 20 anos do MST'' e ''baile de confraternização''.

O relatório do TCU aponta indícios de que três advogados da Anca foram remunerados por meio dos convênios com os órgãos públicos: ''Os profissionais da área jurídica que executam os projetos conveniados pela Anca são os mesmos que defendem os interesses da entidade institucionalmente. (...) Há forte indício de que são prestadores permanentes de serviços e recebem remuneração por meio dos convênios''.