Título: Presidente inflama o país contra Israel
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Fonte: Jornal do Brasil, 29/10/2005, Interncional, p. A12

Ahmadinejad ignora repúdio mundial e Conselho de Segurança o condena

TEERÃ - O presidente do Irã, Mahmoud Ahmadinejad, manteve ontem, sob aplausos de milhares de simpatizantes, a conclamação feita para eliminar Israel do mapa. A frase, dita na quinta-feira em um congresso contra o sionismo, levou o ex-guarda revolucionário a receber uma enxurrada de críticas e uma condenação por parte do Conselho de Segurança das Nações Unidas. E fez subir consideravelmente as tensões em uma região já habitualmente conflagrada. Temendo um isolamento internacional, a chancelaria desfechou uma operação diplomática para reduzir os estragos na imagem do país, até agora sem sucesso.

Israel queria a expulsão dos iranianos do organismo, mas a medida não tem o apoio dos EUA e de outros países, mesmo que concordem quanto ao teor agressivo da declaração, considerada inaceitável pelo secretário-geral Kofi Annan e pelo Vaticano. Ahmadinejad foi repreendido até pela Rússia, aliada de Teerã. A condenação do Conselho foi bem recebida em Jerusalém, para quem o recado ''deve ser lavado a sério''.

Para o público interno, a campanha ganhou impulso. Aos gritos de ''morte a Israel'' e ''morte à América'', milhares de iranianos convergiram de nove pontos da capital para um comício com a participação de várias autoridades importantes. Alguns atearam fogo ou pisotearam bandeiras israelenses e dos EUA. Ahmadinejad fez uma rápida caminhada em meio à multidão, sempre recebendo apoio. Para ele, as críticas não são importantes.

- Minhas palavras são as palavras da nação iraniana. Os ocidentais são livres para comentar, mas suas reações são inválidas. São pessoas que desejam que todo o mundo lhes obedeça - disse.

O Irã não reconhece o direito de Israel a existir. O governo diz não dar treinamento nem armas a extremistas palestinos, mas admite apoio moral à causa. Nesse contexto, na capital iraniana não se considerou a avaliação presidencial como prenúncio de um confronto. Em Moscou, a embaixada iraniana tentou atenuar a repercussão da fala do ex-prefeito de Teerã, com pouca experiência diplomática, eleito com os votos dos pobres e dos devotos.

''O senhor Ahmadinejad não teve intenção de se pronunciar em termos tão violentos e de entrar em um conflito'', disse a nota, na primeira reação oficial. ''A posição do Irã é baseada na necessidade de realizar eleições livres nos territórios ocupados''.

A embaixada em Moscou é freqüentemente usada para que o regime islâmico opine sobre política externa. A Rússia serve de ligação entre Teerã e o Ocidente em assuntos como o programa nuclear iraniano, mas, para analistas, as declarações de Ahmadinejad abalaram a intenção do Kremlin de impedir que o programa seja submetido ao Conselho de Segurança.

Os atos de Teerã e de outras cidades do Irã foram organizados por radicais islâmicos para o ''Dia de Qods'' (Jerusalém, no idioma farsí ), que é celebrado no país na última sexta-feira do Ramadã (jejum muçulmano).

Soldados, funcionários públicos e mulheres cobertas pelo chador participaram.

- Ahmadinejad fala em nome de todos nós. Estamos prontos a morrer pela Palestina - disse Mohammad Mirzayi, 25 anos, voluntário da milícia Basiji, que fiscaliza restrições sociais religiosas, como o código de vestimentas para mulheres.

- Está cada vez mais claro entre políticos reformistas e até alguns aliados que Ahmadinejad não tem a experiência política e o conhecimento necessários para conduzir o país - afirma Issa Saharkhiz, jornalista político na capital iraniana. - Parece que o tempo ficou congelado para ele. Fica repetindo os slogans que gritava quando ainda era um estudante. A questão é que agora é presidente - completa.

Líderes políticos religiosos têm se mantido em silêncio quando em público quanto a Ahmadinejad. Mas, reservadamente, admitem muita preocupação.