Título: Confiança do estrangeiro em crise
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Fonte: Jornal do Brasil, 29/10/2005, Economia & Negócios, p. A17
Saldo de investimentos de multinacionais no país cai 93% em setembro, para US$ 43 milhões, no pior resultado em dez anos
BRASÍLIA - A crise política iniciada há quatro meses já começa a interferir no ritmo de ingressos de investimento estrangeiro diretos no país. É o que demonstram os dados sobre contas externas divulgados ontem pelo Banco Central. A entrada de recursos destinados ao setor produtivo despencou 93,4% em setembro, na comparação com agosto. No pior resultado em dez anos, foi registrada a entrada de apenas US$ 43 milhões, ante US$ 1,1 bi do mês anterior. O mau desempenho ofuscou o recorde das transações correntes - saldo das trocas comerciais e de serviços entre o Brasil e o resto do mundo, um importante indicador da queda da vulnerabilidade do país - que atingiu US$ 2,38 bi, o segundo melhor patamar da história, puxado pelas exportações.
A queda abrupta na entrada de capitais reflete uma menor disposição do estrangeiro em financiar a construção e a expansão de empresas no setor produtivo. O chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, minimizou, porém, o resultado, considerando-o ''um ponto fora da curva''. Segundo ele, foi influenciado pela concentração de retorno de investimentos. Os dados, porém, mostram que, em setembro, os estrangeiros aplicaram US$ 1,7 bilhão, contra US$ 3,6 bi em agosto, US$ 4 bi em julho e US$ 2,15 em junho. O saldo de investimento estrangeiro ficou bem abaixo do que previsto pelo Banco Central para o período, que era de US$ 300 milhões.
- Tivemos algumas operações vinculadas ao sistema financeiro de venda de participação estrangeira. Uma dessas chegou a US$ 290 milhões. E temos uma outra operação vinculada ao sistema financeiro em que os recursos nem efetivamente saíram do país, embora apareçam como recursos expatriados. Foi uma transformação de participação em aquisição de ações - disse, referindo-se a uma instituição financeira que retirou recursos e investiu na forma de aquisição pulverizada de ações no mercado brasileiro, totalizando US$ 230 milhões.
Outro resultado negativo, segundo Lopes, foi a aquisição de empresa de capital estrangeiro por uma nacional, no valor de US$ 250 milhões, no setor petroquímico. Nas contas, a operação aparece como saída de capitais. Ao todo, as saídas totalizaram US$ 1,7 bi. A estimativa do BC é que os investimentos estrangeiros atinjam saldo de US$ 800 milhões em outubro.
No total, a conta de capital e financeira (que registra os fluxos de investimentos produtivo e financeiro) fechou em saldo de US$ 752 milhões, ante o resultado negativo de US$ 1,06 bi verificados no mês anterior.
Já o resultado recorde de US$ 2,3 bilhões nas transações correntes foi puxado, principalmente, pela balança comercial, que registrou saldo de US$ 4,3 bilhões. O dólar fraco segue estimulando as viagens de brasileiros ao exterior, que apontou saldo negativo de US$ 115 milhões, contra US$ 103 milhões em agosto. No ano, as transações correntes acumulam saldo de US$ 11,062 bilhões, o equivalente a 1,91% do Produto Interno Bruto (PIB). Para o mês de outubro, o Banco Central espera que a conta de transações correntes feche com superávit de US$ 800 milhões.
O estoque da dívida externa em julho registrou queda de US$ 9,7 bilhões em relação a junho, totalizando US$ 181,608 bilhões. É o menor nível de endividamento desde 1996. Já as reservas em moeda estrangeira em setembro aumentaram US$ 1,9 bilhão, totalizando US$ 57 bi.
No mês, o resultado global do balanço de pagamentos (soma da conta financeira e das transações correntes) ficou superavitário em US$ 2,548 bilhões. Já o saldo anual chegou a US$ 7,12 bi, ante US$ 590 milhões dos nove primeiros meses de 2004.
Com Silmara Cossolino