Título: Funai alertou mineradora
Autor: Mariana Carneiro
Fonte: Jornal do Brasil, 04/11/2005, Economia & Negócios, p. A22

A Fundação Nacional do Índio (Funai) alertou há três anos a Vale do Rio Doce para o despreparo das tribos indígenas de Carajás na administração de recursos concedidos pela mineradora. O administrador da Funai em Belém, Eimar Araújo, não nega as acusações da Vale - as associações indígenas estariam comprando carros de luxo, aviões, e outros ''pleitos estranhos''-, mas afirma que entregou pessoalmente um documento no qual alerta para a ''falta de noção financeira'', de algumas tribos.

- Os índios Xikrins não têm noção financeira, não têm estudo e as associações são gerenciadas por homens brancos - narra Araújo.

Conforme a lei, a Vale destina recursos aos índios próximos ou estabelecidos ao longo dos trajetos da produção de minério de ferro, que é de 85 milhões de toneladas por ano em Carajás. De 1989 até o início desta década, segundo ele, a mineradora entregava o dinheiro à Funai. Mas depois a companhia passou a encaminhar os recursos diretamente às aldeias, dirigidas por associações. A prática sem intermediação, segundo a Funai, não está formalizada em lei. Procurada, a Vale não quis comentar.

- Deveria haver um termo aditivo ao convênio que oficializasse a prática - diz Araújo. O convênio estabelece que a Vale atenda às necessidades de saúde, educação, infra-estrutura e atividades produtivas como contrapartida ao uso das terras.

De acordo com a companhia, foram destinados neste ano R$ 19 milhões para índios no Maranhão e no Pará. Não são projetos voluntários, ao contrário do que conta a Vale em comunicado publicado nos jornais. A Resolução 331 do Senado, nos termos da Constituição, estabelece que, em troca do direito de usar terras da União para produzir minério, a Vale tem alguns deveres a cumprir. Mas a própria empresa denuncia que entre os pedidos recebidos ''em anos anteriores, estão: um avião bimotor, milhares de litros de gasolina, carros de luxo para lideranças indígenas, a contratação de empreiteiras impostas pelas próprias comunidades indígenas para a construção de casas com preços muito acima dos praticados pelo mercado e o pagamento de dívidas contraídas pelos índios no comércio da região''.

Insatisfeitos com a Vale, índios Xikrins da tribo Cateté ocuparam entre o dia 30 e 1º as instalações da Vale, pois estariam insatisfeitos com a determinação de um teto para as negociações dos recursos. Neste ano, eles estão recebendo R$ 6 milhões para uma comunidade de 850 índios.

Os índios Xikrin, que ameaçam parar a produção da Companhia Vale do Rio Doce, em Carajás, se reunirão com a empresa e representantes da Funai no Ministério Público de Marabá, no Pará, no próximo dia 5. O objetivo é tentar conciliar os pedidos dos indígenas com a oferta da mineradora. Na terça-feira, a empresa disse que 300 índios teriam invadido a zona urbana de Carajás, cidade onde está localizada mina responsável por cerca de 30% da produção total da Vale.