Título: Congresso terá de seguir Justiça
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 09/11/2005, País, p. A2

O presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ministro Edson Vidigal, defendeu ontem o direito do deputado José Dirceu de recorrer ao Supremo Tribunal Federal (STF) para evitar a cassação de seu mandato. Ele afirmou que deputados e senadores que reclamam de ingerência do Judiciário sobre o Congresso precisam estudar melhor a Constituição, que prevê o direito de recorrer ao Supremo. O ministro ressaltou que não saía em defesa de Dirceu e sim explicava teoricamente o que diz a legislação:

- Por favor, não vão dizer amanhã que eu estou defendendo o Dirceu. Estou apenas ajudando vocês (jornalistas) a entenderem o caso.

Vidigal, que participou ontem, no Rio, do Fórum Mídia e Violência, promovido pelo Sindicato dos Jornalistas do Rio de Janeiro, não poupou críticas aos parlamentares e até aos processos de cassação em curso no Congresso.

- Muitos deputados e senadores não estão lendo a Constituição. Está lá que qualquer pessoa que se sinta lesada, tem o direito de ir ao Judiciário reclamar. O Fórum competente para reclamar contra o Senado ou a Câmara dos Deputados é o STF. Não é ingerência nenhuma - apontou.

Em mais uma consideração teórica, Vidigal lembrou que ninguém pode ser considerado culpado antes de ser julgado, ao comentar a declaração do presidente Lula no programa ''Roda Viva'' de que não havia provas contra Dirceu e que o deputado será cassado por motivações políticas.

Em relação aos processos de cassação que correm no Congresso, o presidente do STJ avalia que a Constituição deveria ser modificada neste caso. Na sua opinião, o Judiciário deveria assumir o papel de julgar estes processos.

- Os iguais não devem julgar os seus iguais porque isso gera um processo de retaliação interminável, principalmente no palco político. É um grande erro instituir a cassação de mandato parlamentar por falta de decoro parlamentar - defende.

Para o ministro do STJ, a cassação de parlamentares abre um precendente para a volta do totalitarismo.

- Basta que um partido tenha maioria, que pode começar a cassar todos os seus adversários, com o argumento de falta de decoro. Hoje é o José Dirceu, manhã pode ser qualquer um - disse.

Ele acrescentou que o conceito de falta de decoro é discutível e que outras penas como suspensão do mandato ou do pagamento por um período poderiam ser aplicados nestes casos.

Vidigal usou a palavra ''denuncismo'' ao comentar o caso. O presidente Lula também falou de ''denuncismo vazio'' quando a CPI dos Correios denunciou que o Banco do Brasil era uma das fontes do mensalão.

- Muitas suspeitas induzem a conclusões negativas. A onda de denuncismo é muito comum no facismo. - afirmou.

O ministro disse que não assistiu toda a entrevista de Lula na noite de segunda-feira na TV Cultura, mas apontou que gostou da frase ''Tem hora que nem eu me agüento mais''. Durante a palestra, Vidigal afirmou que também gostaria de usar a frase quando é alvo de denúncias, segundo ele infundadas, da imprensa.

Vidigal voltou a criticar a atuação das três CPIs que estão em curso no Congresso. Desta vez, o alvo do ministro foi a conduta desrespeitosa dos parlamentares entre eles e com depoentes. Ele já havia citado que os parlamentares estavam perdendo tempo com os longos depoimentos.

- Os parlamentares se comportam de formas não muitos aplaudíveis, falando alto, de forma agressiva. As CPIs dizem que tem a mesma prerrogativa do Poder Judiciário, mas no Judiciário, o juiz tem que tratar com respeito as partes - disse.