Título: Remédio contra o baixo crescimento
Autor: Mariana Carneiro
Fonte: Jornal do Brasil, 06/11/2005, Economia & Negócios, p. A20
Estudiosos preparam artilharia para debater alternativas à política econômica conduzida pelo governo petista
Os números positivos divulgados pela equipe econômica fazem supor que se há críticas na esfera política, na economia vai tudo bem. Não é bem o caso. Intelectuais das Ciências Econômicas se organizam e pretendem romper a calmaria e apresentar alternativas à prática da política econômica.
- Integrantes do governo, homens de pouca fé, acreditam que se o Brasil crescer a taxas muito aceleradas colocará em risco a estabilidade de preços - afirma o economista Fábio Erber, que esteve a serviço do governo no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) na gestão Carlos Lessa. - É uma busca pela estabilidade bastante diferente daquela dos anos 60, de (Roberto) Campos e (Mário HenriqueSimonsen, que defendiam uma estabilização gradual, porque também é preciso crescer.
Convencidos de que é possível ''fazer diferente'', eles se reúnem e debatem, ao longo desta semana, alternativas - e críticas - à política econômica.
- Todos supuseram que, passado 2003 com aquele resultado pífio com políticas ortodoxas, em 2004, isso seria abandonado, o que não ocorreu até agora. É sempre possível tomar uma trajetória diferente. Essa idéia de que só há um caminho é fruto de uma convenção - avalia Erber.
Para o também professor da UFRJ Fábio Sá Earp, que organiza o debate, as boas notícias no front econômico não são consensuais, além disso, há a crítica mais contundente: ''não há projeto de desenvolvimento de longo prazo''.
- O governo precisa produzir boas notícias, até para ajudar na sua convivência com as denúncias do ''valerioduto'' - pondera Earp. - Acho que para os empregados do setor informal, as notícias não são tão positivas assim.
Além dos dois, o time dos descontentes é integrado ainda pela professora da USP Leda Paulani, que participou do grupo de economistas que rompeu com o governo Lula no documento batizado de Carta de Campinas, assim como o professor da UFRJ Reinaldo Gonçalves. Além do professor da FGV-SP, Yoshiaki Nakano.
A questão não é se o governo executa superávit primário (economia para o pagamento de juros) três meses antes, ou se pratica uma política monetária restritiva, mas sim a forma como ela é conduzida, alertam os economistas.
- Não se trata da eliminação do superávit primário, mas há uma distinção substancial entre fazer 4,5% do PIB (Produto Interno Bruto, soma de todas as riquezas produzidas no país) e 1,5%. A diferença permitiria, por exemplo, que o governo reformasse estradas ou investisse em políticas de segurança pública. O país está sucateado por causa disso - ataca Earp.
Para Erber, a redução da taxa básica de juros (Selic) - atualmente em 19% ao ano - seria mais eficiente para conter os gastos do governo, uma vez que o superávit primário corta despesas, mas também investimentos.
Para os economistas, a remuneração atual da dívida pública - via taxa básica de juros - e a busca por uma inflação baixa demais são exemplos de outros ''exageros'' cometidos pelo governo petista.
- Passou do ponto - afirma Erber.
- Ninguém questiona o pagamento da dívida, mas precisa ser 20%? - endossa Earp. - A inflação tolerável, a meu ver, tem que ter um dígito, mas existe diferença entre uma taxa de 4% e 9% ao ano. Dentro do limite de 10%, pode-se chegar a um crescimento na casa dos 6% e 7%, sem gargalo. É sintonia muito fina.
Para Erber, dessa maneira a atual condução da política econômica cria incertezas quanto à sustentação do crescimento econômico no longo prazo, e gera, como efeito colateral, maior vulnerabilidade do país frente a investidores externos.
Mas nenhum risco adicional se deve à troca de comando no Federal Reserve (Fed, o banco central americano). Em janeiro, assume o comando da instituição Ben Bernanke, que para muitos analistas tem uma perspectiva mais conservadora da economia.
- Não se pode prever como agirá o presidente do Fed até a sua posse. Lá ele encontrará uma equipe para desenvolver o trabalho em conjunto - diz Earp.
- O órgão pensante do homem é o traseiro, pensa-se de acordo com a cadeira em que está sentado e isso vale para todos. Exemplo claro é o ministro Palocci, que quando era prefeito era contra a Lei de Responsabilidade Fiscal e hoje é seu defensor - emenda Erber, divertindo-se.
Para ele, o governo avançou na elaboração de uma política industrial capaz de levar o país a uma evolução de longo prazo, mas a trajetória foi interrompida.
- Mas o desenvolvimento não depende só dela. A política industrial interage com a política macroeconômica, que atualmente visa a manter taxas de crescimento baixas. Assim, não há espaço de atuação - avalia Erber.
Recentemente, o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, defendeu-se das críticas sobre falta de recursos, referindo-se ao combate à aftosa, dizendo que havia problemas de projeto e não falta de dinheiro. Haveria problema semelhante em outras esferas de gestão?
- Sem dúvida, o desmantelamento do Estado ao longo dos anos 90 prejudicou a máquina e ajuda atrapalhar a liberação de recursos - admite Erber.
E traçam previsões pessimistas para o PT em 2006:
- O governo tentará reeditar a Velhinha de Taubaté, aquela que acredita no que o governo diz. Mas será difícil convencer a população se não for possível apresentar resultados no primeiro semestre, o que será muito complicado com a Fazenda segurando o dinheiro - aposta Earp.