Título: Guardas e camelôs dividem a calçada
Autor: Mariana Filgueiras
Fonte: Jornal do Brasil, 16/11/2005, Rio, p. A11

Com horários marcados para percorrer as ruas e encerrar o trabalho, fiscalização deixa à vontade o comércio clandestino

Depois de períodos de guerras diárias nas ruas do Centro, a Guarda Municipal e os ambulantes parecem em trégua. Há seis meses, como informa a prefeitura, não há conflitos - a Polícia Militar confirma. A calmaria aparente está longe de representar uma solução para o comércio clandestino no Centro. Com horas marcadas para percorrer as calçadas da Avenida Rio Branco, guardas municipais fazem vista grossa para barracas e toldos de camelôs, que saem de cena a cada passagem da tropa e retornam, minutos depois, aos pontos mais cobiçados. A poucos metros dos guardas municipais, vendedores e ajudantes trazem as mercadorias em ''burros-sem-rabo'' - carrinhos de duas rodas - e montam suas barracas para vender toda sorte de produtos. A desordem atravanca a passagem dos pedestres e a confusão piora justamente na hora do rush, quando os guardas vão embora.

- Eles ficam embaixo do relógio, dá para ver a hora que se juntam para ''passar o rodo'', normalmente em hora em ponto - explica, sem se identificar, um vendedor de aparadores de pêlos de nariz, despertadores e pilhas.

- São quatro e meia. Eles vão passar de novo às cinco. A gente recolhe tudo, mas depois eles vão embora, às seis - informa outro, que vende pães e biscoitos.

Na última sexta-feira, no ponto de encontro dos guardas - na esquina da Rua Sete de Setembro com a Avenida Rio Branco - foi possível identificar, passo-a-passo, como funciona o esquema. Até as 16h, as calçadas estavam livres das barracas. Com os guardas estrategicamente posicionados, apenas alguns ambulantes arriscavam a venda de pequenos produtos, muitas vezes exibidos com as mãos.

Às 17h, o ônibus da Guarda Municipal estacionou na Rua Sete de Setembro para levá-los embora. Às 17h30, os fiscais começaram a se concentrar próximos à viatura. Alguns não tiravam os olhos do relógio, impacientes. Às 17h44, dois ambulantes posicionaram os carrinhos com mercadorias nas barbas da fiscalização. Na esquina ao lado, na Rua do Rosário, oito ambulantes montavam estruturas de até seis pés de ferro para exibir as mercadorias.

Assim que o ônibus deixou o local, às 18h05, as esquinas se transformaram numa feira livre. Às 18h22, com o dia ainda claro, o circo já estava armado: CDs piratas, chicletes, bancas de churrasquinho, com mesas, cadeiras e até um guarda-sol. No mesmo lugar em que, 17 minutos antes, os fiscais mantinham a ordem. Às 18h34, o Centro estava inviável para os pedestres. Na Avenida Rio Branco, entre as ruas Sete de Setembro a Ouvidor, vinte e três camelôs já estavam montados.

A Guarda Municipal alega que os conflitos cessaram porque a corporação está desenvolvendo um redimensionamento do efetivo, com homens do Grupamento de Ações Especiais e Grupamento Tático Móvel da Guarda Municipal atuando junto à 1ª Inspetoria, responsável pelo Centro. No total, são 90 os guardas atuando diariamente nos trechos de maior movimento, das 7h às 19h.

De acordo com a Guarda, depois de uma operação realizada na Central do Brasil há duas semanas, 90 camelôs que trabalhavam sem autorização foram expulsos do local. A própria guarda explica que a flutuação dos ambulantes para outros trechos da cidade já era esperada, principalmente às vésperas do Natal.

A Guarda Municipal informou também que o efetivo do Centro vai receber um reforço até o Natal, que pode ser de até 30 homens. No dia em que foi realizada a reportagem, a única apreensão feita pelos guardas foram duas mochilas com 265 CDs.