Título: Teerã faz chantagem à ONU
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Fonte: Jornal do Brasil, 21/11/2005, Internacional, p. A7

O Parlamento iraniano aprovou ontem um projeto de lei que permite ao país, além de retomar o enriquecimento de urânio, impedir a inspeção de suas atividades nucleares pela ONU se a questão for levada ao Conselho de Segurança.

A proposta foi habilitada por 183 dos 197 legisladores presentes na sessão, transmitida ao vivo pela rádio pública. A votação ocorreu quatro dias antes da reunião da Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA) que vai discutir, na quinta-feira, a violação do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares por Teerã.

A ameaça de represália do Irã fortalece a posição de resistência do governo frente à pressão internacional para que abandone o programa atômico. De acordo com o texto, ''se o caso nuclear for enviado ao Conselho de Segurança da ONU, o governo iraniano vai parar de aplicar medidas voluntárias (de controle) e passará a incentivar os programas de pesquisa e execução científica para garantir o respeito dos direitos do povo iraniano, conforme o Tratado de Não-Proliferação Nuclear'', assinado por Teerã, mas sem nunca ter sido ratificado.

- Ao aprovar esse projeto de lei, estamos mandando uma recado à AIEA - deixou claro Alaedin Boroujerdi, líder da Comissão de Política Externa e Segurança Nacional do Parlamento iraniano, advertindo a agência para que não ameace o país. - Senão, pediremos ao governo para suspender as medidas voluntárias - acrescentou, referindo-se à autorização de inspetores internacionais em suas instalações nucleares.

Os Estados Unidos acusam o Irã de usar o enriquecimento de urânio para a fabricação de armas nucleares. Já Teerã defende que o programa tem fins pacíficos e visa produzir energia elétrica.

Segundo um relatório da AIEA, apresentado ontem, o Irã recebeu um projeto de planta nuclear de uma rede ilegal coordenada pelo cientista paquistanês Abdul Qadir Khan, responsável pelo programa do Paquistão e pelo projeto de bomba atômica da Líbia. O documento, oferecido a Teerã em 1987, estabelecia os passos do processo nuclear, ensinando como acondicionar ''urânio enriquecido, natural ou exaurido em formas hemisféricas''. Representantes da agência disseram que os desenhos parecem ser o esboço para a fabricação de uma ogiva.

Um alto funcionário de Washington considerou a descoberta ''perturbadora'' e avisou que o relatório será usado para levar o Irã ao Conselho de Segurança.

No entanto, de acordo com a administração de Mahmoud Ahmadinejad, o relatório da AIEA é ''sem fundamento'':

- Não passa de especulação da mídia - afirmou o ministro das Relações Exteriores, Hamid Reza Asefi.

O Irã quebrou o acordo com Grã-Bretanha, França e Alemanha e retomou, em agosto, o processamento de urânio - etapa anterior ao enriquecimento, fase essencial para a produção de armamento -, na usina de Isfahan. Na época, o governo afirmou estar disposto a chegar a negociar com a comunidade internacional.

Para a União Européia e os EUA, o país persa deve interromper permanentemente o enriquecimento, mas Teerã alega que o tratado permite a atividade quando os objetivos são pacíficos, e que, por isso, não desistirá do programa.

Na última sexta-feira, manifestantes fizeram um cordão de isolamento humano em volta da usina nuclear de Natanz, para protestar contra os EUA e nações que se opõem ao ''direito iraniano'' de dar prosseguimento ao programa atômico.