Título: Israel e Hisbolá entram em combate
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 22/11/2005, Internacional, p. A8

No pior choque dos últimos cinco anos, tropas de Israel e milicianos libaneses do grupo xiita Hisbolá entraram em combate ontem nas proximidades da aldeia de Ghafar, Norte de Israel, na região disputada das Granjas de Shebaa. A pequena vila foi dividida por uma linha traçada pelas Nações Unidas depois da retirada israelense do Líbano. O combate, com tiros de canhões e disparos de foguetes e armas pesadas, durou mais de duas horas e deixou saldo de quatro mortos, três guerrilheiros e um soldado. Pelo menos cinco militares também teriam ficado feridos.

As razões do início do tiroteio não estão claras. Segundo o governo de Israel, a guarnição instalada no portão de acesso à cidade percebeu uma tentativa de infiltração por parte de um grande contingente de guerrilheiros. O grupo teria usado as construções da cidade para encobrir a movimentação. O objetivo da operação, segundo essas fontes, seria o de capturar militares para trocá-los por integrantes do Hisbolá ou por militantes palestinos que estão nas prisões do Sinai.

Já a milícia divulgou comunicado afirmando que jipes com soldados haviam invadido a parte libanesa da vila, levando os guerrilheiros a uma reação. Para compreender a acusação, é preciso levar em conta a complicada geografia política surgida como resultado da desocupação desse disputado pedaço de terra do Sul libanês - reclamado também pela Síria.

A divisa em Ghafar é uma cunha, demarcada por uma faixa amarela pintada ao longo da principal avenida de acesso. À esquerda da linha, até uma ravina onde corre uma nascente do Rio Jordão, é território israelense. À direita, e do outro lado do rio, o domínio é do governo libanês, embora o Estado naquela área seja o Hisbolá. Veículos de Israel só podem trafegar do lado esquerdo da faixa, até o ponto onde foi instalado um mirante.

O clima é tenso há muito tempo, mas vem se deteriorando mais rapidamente por inúmeros motivos. Um deles foi o fato de o grupo xiita ter instalado uma elevatória para bombear a água do rio, quebrando um frágil acordo informal em torno do aproveitamento hídrico da nascente. A ravina igualmente já foi palco de ações de infiltração. São comuns histórias contadas por oficiais sobre a morte de supostos milicianos que tentavam atravessá-la.

A movimentação israelense e a vida em Ghafar são controlados por um posto da milícia a 500 metros da guarnição das Nações Unidas (Finul) encarregada do cumprimento do acordo assinado em 2000. Os capacetes-azuis franceses, no entanto, são completamente impotentes para impedir que choques como os de ontem aconteçam. Apesar de a Resolução 1559 da ONU assim o exigir, Beirute se recusa a desarmar os milicianos, cujo poder político e militar na área suplanta o do próprio governo eleito. Por outro lado, os observadores denunciam as freqüentes invasões do espaço aéreo libanês por parte da aviação militar de Jerusalém.

No confronto, dois veículos, atingidos por tiros de canhão e foguetes, e o próprio posto de controle israelense, na entrada da vila, acabaram destruídos e incendiados, segundo o comunicado. Mais de 300 obuses foram disparados no ataque à guarnição de Ghafar e a outros pontos. Na cidade de Kyriat Shmona, ao alcance das armas dos guerrilheiros, toda a população foi posta em abrigos por ordem do Exército.

A resposta militar israelense foi imediata e incluiu o bombardeamento, com canhões de 150 e 175 mm, contra posições inimigas nas aldeias libanesas de Helta, Al Wazani, Al Masdie e Kfar Saba. Nesses locais, destacamentos da guerrilha xiita haviam rapidamente montado bases para lançar foguetes russos Katyushas contra as cidades do outro lado da fronteira. Testemunhas contaram ter escutado mais de 250 explosões. Também no contra-ataque, caças F-16 atingiram um posto de comando do Hisbolá na cidade de Metula, também em território libanês. Não há informações sobre baixas.