Título: Palocci ''mais firme do que nunca''
Autor: Daniel Pereira e Sérgio Pardellas
Fonte: Jornal do Brasil, 23/11/2005, País, p. A3
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que Antonio Palocci Filho está ''mais firme do que nunca'' no comando do Ministério da Fazenda. O gesto de apoio ocorreu quando o ministro jogava no Congresso cartadas decisivas nas duas frentes que ameaçam a permanência dele no cargo - os rumos da economia e as denúncias que o envolvem em irregularidades. Em audiência na Comissão de Finanças e Tributação na Câmara, Palocci defendeu a política econômica e o projeto de ajuste fiscal de longo prazo, considerado ''rudimentar'' pela chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Na CPI dos Bingos, Palocci conseguiu, graças a um entendimento entre oposição e governo, evitar a aprovação de requerimento destinado a convocá-lo a depor na comissão, o que evitaria mais um constrangimento em um momento já delicado. A visita seria ''espontânea''. Apesar da declaração presidencial e do resultado da CPI, a sensação dentro do PT, ontem à noite, era a mesma do início do dia. A situação do ministro da Fazenda continua em aberto e suas explicações ainda não são capazes de dissipar as especulações em torno de sua saída do governo.
Apontado nos bastidores como provável substituto de Palocci na Fazenda, o líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante (PT-SP), afirmou que o ministro continuará na função.
- O presidente Lula deixou muito claro que a política econômica é do governo. Esse é o rumo e será preservado - declarou Mercadante.
Nos bastidores, aliados do Palácio do Planalto fizeram circular a versão de que um pedido de demissão por parte de Palocci é questão superada. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), também entrou no circuito. Ele disse que o ministro da Fazenda já mostrou condições de se defender das acusações. Mas pediu ajustes na condução da política econômica, sobretudo na questão dos juros elevados e do real valorizado. Para Renan, o refinamento pode ser feito pelo próprio Palocci.
- Há uma disputa evidente sobre política econômica hoje, mas o ministro está prestigiado - afirmou o senador Tião Viana (PT-AC), que foi um dos articuladores do acordo que impediu a votação do requerimento de convocação de Palocci.
Dentro do próprio PT, parlamentares de peso analisam que a situação de Palocci é complicada. O acerto na CPI dos Bingos, por exemplo, seria apenas uma gentileza com o ministro, que sairia da função sem o constrangimento de uma convocação nas costas.
- O governo está preparando o cadafalso - declarou uma estrela petista.
Em segmentos empresariais, a sensação é a mesma. Apesar de defender Palocci nas declarações públicas, um industrial habitué do Planalto dava como certa a saída dele do governo ontem.
- Há chances de o Palocci comparecer à CPI dos Bingos sem ser mais ministro. E não são poucas - afirmou o líder da minoria no Senado, José Jorge (PFL-PE).
Até a madrugada de ontem, Palocci estava disposto a deixar o cargo. Disse a interlocutores que estava se sentindo ''traído'' e ''trucidado internamente''.
- A situação é séria. Acho que dessa vez não tem volta - avaliou um auxiliar do presidente.
Coube ao deputado Luiz Eduardo Greenhalgh (PT-SP), no papel de líder interino do PT na Câmara, traduzir em palavras o estado de espírito do ministro da Fazenda, em reunião na residência oficial da presidência da Câmara, da qual também participavam Aldo Rebelo, presidente da Casa, o deputado Beto Albuquerque (PSB-RS), vice líder do governo na Câmara.
- Palocci entregou os pontos - disse Greenhalgh, esbaforido, tão logo chegou ao encontro.
O encontro ocorreu entre 23 horas e meia-noite. Autorizado pelo Planalto, Greenhalgh partiu dali para outra missão: a de serenar os ânimos do ministro, naquela ocasião, demissionário. Juntaram-se ao deputado petista os ministros do Planejamento, Paulo Bernardo e da Coordenação Política, Jaques Wagner, que, entretanto, nega. Em conversa que durou mais de duas horas e entrou madrugada adentro, os três conseguiram demover Palocci da idéia de abandonar a Fazenda sob o argumento de que ele estaria prestigiado pelo presidente Lula e contava com o respaldo da equipe de ministros.
De acordo com integrantes do governo, Palocci sentiu-se fragilizado porque esperava de Lula uma declaração de apoio mais contundente, como das outras ocasiões em que teve sua atuação contestada pelo ministro da Casa Civil, José Dirceu, por exemplo. As medidas até então tomadas pelo presidente, como a de gastar no limite da meta fiscal de 4,25%, sinalizariam que a ministra Dilma Rousseff, teria vencido a queda-de-braço depois das divergências públicas.
O ministro teria se sentido traído porque enxergou as digitais de colegas da Esplanada dos Ministérios e do PT nas declarações de Dilma de que o ajuste fiscal de longo prazo com superávit primário de 4,25%, plano apresentado por ele, seria ''rudimentar'' e que, ao não diminuir a relação entre a dívida pública e o PIB, a política monetária ''enxugava gelo''.
O raciocínio, em tese, estaria respaldado nas palavras de um ministro do governo com trânsito livre no Planalto. Segundo ele, Dilma, ao criticar o arrocho fiscal e pregar uma aproximação à meta fiscal de 4,25%, vocalizou o sentimento de parte do governo interessada em acelerar os investimentos.