Título: Chance de renovar as finanças
Autor: Mariana Carneiro
Fonte: Jornal do Brasil, 14/11/2005, Economia & Negócios, p. A17
Com o 13º salário nas mãos, é difícil controlar a tentação de não gastar caprichando no presente de Natal. Mas nunca é demais lembrar que nem tudo deve se esvair no consumo de fim de ano. Especialistas em gestão de recursos dão dicas sobre o que fazer com as reservas obtidas no fim do ano, em quê aplicar e, em caso de endividamento - que, este ano, atingiu níveis recordes com a expansão do crédito - como usar as opções oferecidas no mercado para pagar menos. E, ao que parece, desta vez, os conselhos cairão menos no vazio: pela primeira vez em muitos anos, foi identificada uma preocupação maior em desviar do caminho do consumo parte dos R$ 46 bilhões que o pagamento do benefício injetará na economia este ano.
Ainda falta uma semana para que as empresas iniciem o pagamento da primeira parcela do 13º. Mas é bom lembrar que, passado o Natal, o que restam são as contas de início de ano. É o período em que são pagos impostos, como o IPTU e o IPVA, além da mensalidade do colégio dos filhos ou da pós-graduação. Para sobreviver ao calendário, é necessário, alertam especialistas, uma reserva com parte do 13º salário.
- Na pesquisa que realizamos todos os anos, pela primeira vez, foi detectado que uma parcela de consumidores já pensa na reserva para o início do ano. Isso mostra que o consumidor está ficando mais consciente e quer evitar despesas no futuro - atesta o vice-presidente da Associação Nacional dos Executivos de Finanças, Administração e Contabilidade (Anefac), Miguel Ribeiro de Oliveira.
Na aferição, 8% dos entrevistados - entre 783 consumidores - dizem que vão reservar parte do dinheiro extra recebido para pagar contas no início do ano.
É o caso do engenheiro Bruno Perrotta, de 30 anos, que não pretende se enforcar nas primeiras semanas de 2006.
- Com certeza vou guardar a metade do 13º para as contas do ano que vem, para os IPs - brinca, referindo-se aos impostos cobrados no início do ano. - O salário não dá para pagar todas as contas, por isso conto com o reforço do 13º. No passado, tive que parcelar esses pagamentos e não foi uma boa.
Se tiver o dinheiro na mão, vale a pena pagar à vista os impostos, aconselha o professor de finanças do Ibmec, Hélio França. Isso porque, se considerados os descontos de anos anteriores (10%), é melhor aproveitar o desconto para desembolsar menos. Entre o recebimento do benefício e o pagamento das contas, a sugestão dele é aplicar o dinheiro em um fundo de renda fixa prefixado, como o CDB ou o DI.
O 13º também pode ser a hora de reforçar as economias. Mas nada de deixar o dinheiro na poupança, alertam especialistas. No mercado, há oportunidades mais atraentes para cada perfil de investidor, até para o mais conservador.
Para o tesoureiro do Banif Primus Banco de Investimento, Rodrigo Boulos, a dica é manter a aposta no real.
- Mesmo com a previsão de queda da taxa de juros, ela ainda é elevada e bastante atrativa em relação a outros ativos - avalia o economista. - Em um ano ótimo, a bolsa teve valorização de 16%, abaixo de aplicações ligadas a títulos, que em dólares renderam perto de 19%.
Em sua opinião, embora seja um ano eleitoral, o câmbio não deverá ter tanta atração para investidores.
- O mercado brasileiro está na mão dos investidores internacionais. Enquanto acharem que os fundamentos da economia brasileira são positivos, o dólar ficará em baixa. Quanto ao cenário político, não imagino a repetição de 2002 - prevê, referindo-se à crise deflagrada pela liderança de Luiz Inácio Lula da Silva nas pesquisas eleitorais daquele ano.
Além da renda fixa, para investidores que queiram buscar rentabilidade mais elevada e aceitem correr algum risco, fundos multimercados (em que o gestor faz um mix de ativos, com renda fixa e variável) e de crédito, como fundos de investimento em direitos creditórios (Fidcs, lastreados em carteiras de crédito e que proporcionam rentabilidade prefixada), que hoje estão mais acessíveis.
Gestor de investimentos da Gap Asset, Rodolfo Bastos lembra que, para apostar em fundos de ações, é preciso observar se a carteira tem papéis de empresas como Vale do Rio Doce e Petrobras, além de bancos.
- O ambiente macroeconômico local é bastante estável e a economia apresenta bons números. A tendência é que a política não afete muito os mercados, mas haverá volatilidade - diz Bastos.
Segundo Franco Delano, diretor da Mellon Global Investments do Brasil, o perfil do investidor varia também de acordo com o prazo que espera de retorno. Para quem tem no horizonte o retorno em seis meses, a opção, segundo ele, deve ser a renda fixa. Os multimercados são indicados para quem tem no horizonte retorno em um ano. Já as ações são para um horizonte de três anos. Isso porque, deve-se considerar a tolerância a perdas.
- O investidor que assume financiamentos deve ser conservador. Para esses, os juros altos oferecem uma boa oportunidade. Poupança é a maior besteira. Se o consumidor migrar para o DI, não perde, não corre risco e vai ter uma rentabilidade maior - indica.
Para França, mais do que aplicar em um fundo de investimentos atrelado a títulos do governo - no caso do DI, pós-fixados - o melhor seria uma aplicação prefixada, como CDB, na expectativa de queda da taxa Selic.
É o que pensa em fazer Bruno Perrotta, com parte do que sobrar das compras de Natal.
- A previsão é que o rendimento da renda fixa comece a cair. Tem muita gente partindo para ações. Mas vou esperar a virada no ano, para ver se será confirmada a tendência de queda da taxa de juros.
Mas os investimentos pós-fixados não devem ser ignorados, sobretudo via Tesouro Direto.
- Sempre vale a pena investir em títulos no Brasil. Com a queda da taxa básica de juros, todos os demais investimentos vêm atrás. Bolsa, câmbio, todos sofrem impacto em termos de retorno - avalia.