Título: Esse crime já foi desvendado
Autor: Augusto Nunes
Fonte: Jornal do Brasil, 20/11/2005, Sete Dias, p. A16

O senador Eduardo Suplicy é bem mais eficiente que o detetive Eduardo Suplicy. Ambos esbanjam determinação, virtude que induziu o sherloque amador a aperfeiçoar um modo extenuante de apurar assassinatos. O sherloque Suplicy sempre volta ao local do crime e bate às portas de todas as casas das imediações. Quem atende ao chamado - seja quem for - ouve as mesmas perguntas e examina as fotos de vítimas ou suspeitos. O método foi aplicado pela primeira vez em 1993, quando Suplicy procurou em Nova York a mulher de José Carlos Alves dos Santos, um alto funcionário do Congresso. Preso, o marido confessou que matara Elizabeth Lofrano dos Santos. Aproveitou o depoimento para revelar patifarias cometidas por parlamentares, e então o detetive acordou. Alguém disse a Suplicy que vira Elizabeth em Nova York. Ele visitou dezenas de hotéis de Manhattan à procura da mulher enterrada numa cova rasa em Brasília. Esse fiasco internacional aconselhou o investigador a hibernar por alguns anos. Despertou com o arrastar de correntes no sotão assombrado pelo prefeito de Santo André, Celso Daniel, assassinado em 2002. Seqüestrado ao voltar do jantar em São Paulo com Sérgio Gomes da Silva, o ''Sombra'', foi encontrado dois dias depois, numa estrada de terra. Sofrera torturas brutais. Os carrascos queriam arrancar-lhe algum segredo. O detetive Suplicy recorreu nesta semana ao casa por casa. Ouviu pedidos, queixas, gritos de apoio, palavrões e um apelo para conseguir verbas federais prometidas ao Rodoanel. Garante que também recolheu informações relevantes sobre o caso. Em nome da CPI dos Bingos, a polivalente CPI do Fim do Mundo, ouviu (na presença dos carcereiros) depoimentos de presos envolvidos no assassinato. Não foi melhor que em Nova York. Na quinta-feira, a CPI inquiriu três supostos mandantes da execução: o empresário Ronan Maria Pinto, o ex-secretário municipal Klinger de Oliveira Souza e o ''Sombra''. Klinger admitiu que a polícia foi pressionada ''para não politizar as investigações''. Os outros, nem isso. Negaram tudo. Negaram a existência do esquema de arrecadação de propinas montado para financiar campanhas do PT. Negaram até que já foram muito amigos. Mas na TV também falam a fisionomia, a gesticulação, os tiques, o ritmo da frase, o vinco que denuncia a tormenta e o medo. Conjugadas, essas vozes endossaram o que aqui se afirma: os três têm culpa no cartório. Participaram da montagem e da movimentação da máquina corrupta. Irritaram-se com o recuo de Celso Daniel: ao saber que os parceiros estavam tungando parte da bolada, quis interromper a bandalheira. O crime tramado por ''Sombra'' teve o aval dos parceiros. Os executores, escolhidos por chefões do crime organizado, encontraram o Pajero de ''Sombra'' parado, com as portas sem travas. Por que levaram só o prefeito? Por que pouparam um homem capaz de identificá-los? Por que não pediram resgate? Por que torturaram a vítima? Por que o apartamento de Celso foi vasculhado antes da chegada da polícia? Por que defendem obsessivamente a a tese do crime comum? Por que sugeriram à namorada do prefeito posar de ''viuvinha triste''? Investigadores competentes provarão: eles são culpados.