Correio Braziliense, n. 21817, 10/12/2022. Economia, p. 8

Haddad procura superar desconfiança

Michelle Portela


Confirmado como ministro da Fazenda do futuro governo, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad (PT) terá como desafios recuperar o crescimento da economia, além de vencer desconfianças do mercado financeiro, que cobra dele compromisso mais claro com o equilíbrio das contas públicas. Ontem, ao ter seu nome anunciado pelo presidente eleito Luíz Inácio Lula da Silva, ele elencou as prioridades do início de sua gestão. “O importante é a gente ter uma agenda forte para 2023: recuperar os acordos internacionais que estão parados, sobretudo com a União Europeia; definir a questão do arcabouço fiscal; e a reforma tributária. Serão grandes movimentos nossos, faremos todos”, afirmou.

 De acordo com o próprio Haddad, a tarefa mais imediata será escolher os secretários do Ministério da Fazenda. “Preciso combinar com o ministro do Planejamento, para a gente ter uma equipe coesa. Eu não fiz convites formais ainda, mas já sondei muita gente”, informou.

 O anúncio não foi uma surpresa. Haddad circula há mais de duas semanas em Brasília como interlocutor de Lula para questões ligadas à economia. No fim de novembro, ele foi a um almoço com banqueiros para falar em nome do presidente-eleito, quando defendeu a urgência da reforma tributária.  

A Federação Brasileira de Bancos (Febraban) foi uma das primeiras entidades a cumprimentar o novo ministro da Fazenda. “Político experiente, afeito ao diálogo e com qualidades reconhecidas, Haddad já assumiu compromisso com o crescimento, agenda social e responsabilidade fiscal, como demonstrou em discurso durante o almoço anual de dirigentes de bancos”, disse, em nota, o presidente da entidade, Isaac Sidney.

Próximo de Lula, Haddad vai assumir como um dos ministros mais poderosos do novo governo, e deve participar da escolha do futuro ministro do Planejamento. O ex-prefeito defende que a pasta — a ser recriada a partir da cisão do superministério da Economia de Paulo Guedes — não incorpore as áreas de Orçamento e Gestão, que ficariam no guarda-chuva do novo Ministério da Fazenda. Uma terceira parte dessa divisão vai virar o Ministério da Indústria, Comércio Exterior e Serviços.

Para Lula, a pasta do Planejamento deverá ficar com um ministro “bastante afinado” com Fernando Haddad. “Já poderia ter indicado o Planejamento hoje, mas vocês não teriam notícia na segunda, terça-feira”, disse Lula, emendando que não deve haver divergências entre Fazenda e Planejamento.

O aceno da Febraban é importante num contexto em que Haddad ainda deverá enfrentar a resistência do mercado financeiro. “Haddad parece uma aposta de Lula para 2026. Nesse sentido, ele não vai inventar muita história. Como ele não é bem visto no mercado financeiro, precisa construir aderência ao mercado e conversar, e espero que ele faça isso nos próximos dias”, avaliou o economista André Perfeito.  

Ao comentar a necessidade de um novo arcabouço fiscal para substituir a regra do teto de gastos, Haddad afirmou que vai estudar propostas — e não apenas dos integrantes da equipe de transição. “Vou ouvir técnicos do Tesouro, vou ouvir a academia, vou ouvir os economistas em que eu confio”, declarou. A criação de novas regras fiscais está prevista no texto da PEC da Transição, que tramita no Congresso.  

Questionado o que diria a quem teme um ministro gastador, Haddad recomendou pesquisar sobre o investment grade da prefeitura de São Paulo. “Fui o primeiro prefeito a conseguir grau de investimento no país. Se você não olhar para a trajetória da pessoa, vai cair em fake news. Para que mais fake news?”, perguntou, acrescentando que essa fase já acabou.