Valor Econômico, v. 20, n. 4967, 25/03/2020. Finanças, p. C1

Ibovespa perde R$ 1,6 tri com crise do coronavírus

Marcelle Gutierrez
Ana Carolina Neira


A volatilidade causada pela crise do coronavírus segue ditando o ritmo dos negócios na bolsa brasileira, com efeitos cada vez mais evidentes no valor das empresas. Afinal, uma recessão global parece quase inevitável neste momento de estresse.

O Ibovespa até conseguiu registrar alta forte, de 9,69%, ontem, aos 69.729 pontos, um alívio em meio à turbulência. Tanto é que acumula perdas de 39,7% em 2020, e baixa de 41,7% desde sua máxima histórica. Em termos de valor de mercado, as empresas que compõem o índice já perderam R$ 1,63 trilhão do pico dos 119.527 pontos em 23 de janeiro até ontem.

Nestes dois meses, a Petrobras foi a que mais sofreu. A estatal petroleira perdeu mais da metade do seu valor de mercado, R$ 223,7 bilhões, e deixou de ser a mais valiosa do Ibovespa, atingindo ontem R$ 174,5 bilhões. A liderança pertence agora ao Itaú Unibanco, seguido por Ambev, Vale e, em quarto lugar, pela Petrobras, conforme levantamento do Valor Data.

A explicação está na crise deflagrada pela pandemia do coronavírus, que gerou uma onda de aversão ao risco no mercado, e na queda dos preços do petróleo para níveis extremamente baixos - inferiores a US$ 30 por barril - diante do recuo da demanda com o avanço da doença e disputa de preços entre Rússia e Arábia Saudita.

Mesmo os papéis mais resilientes, como Itaú Unibanco, Ambev e Vale, não passaram incólumes por este cenário. O Itaú perdeu R$ 108,2 bilhões em valor de mercado, a Ambev R$ 115,8 bilhões e a Vale teve perdas de R$ 94,4 bilhões.

Ontem, o dia foi de recuperação, em linha com o exterior e após dois pregões consecutivos de baixas. Assim, o Ibovespa encostou no patamar dos 70 mil pontos. O respiro veio da expectativa de que seja aprovado nos Estados Unidos um pacote de estímulos econômicos de US$ 2 trilhões para amenizar os efeitos do coronavírus. Em Wall Street, o Dow Jones teve alta de 11,37%.

Mas o movimento de fortes altas na sequência de baixas já é frequente neste mês de elevada volatilidade, e o clima de cautela prevalece, sob a expectativa de que mais pacotes de estímulos sejam aprovados e o número de casos comece a cair pelo mundo. Em 13 de março, por exemplo, o Ibovespa subiu 13,91%, após uma queda de 14,78% na véspera.

“Lá fora sobe bem, então aqui tudo sobe bem também. Não há motivos específicos. É recuperação de preços e só teremos chances de recuperação de fato na bolsa brasileira quando o cenário mundial melhorar”, afirma Adriano Cantreva, sócio da Portofino Investimentos.

Diante destes impactos econômicos do coronavírus e do momento desafiador enfrentado pelos mercados globais, o Itaú BBA revisou sua projeção para o Ibovespa de 132 mil pontos para 94 mil pontos em 2020. A decisão foi baseada nas perspectivas de lucro mais baixo para as empresas que integram o índice, delineando as expectativas para o rebalanceamento da carteira, que acontece no início de maio.

Os analistas do Itaú BBA afirmam que a revisão do Ibovespa para este ano acontece também após a análise do múltiplo P/L (preço por lucro), acima de 11 vezes, o que não é “atraente” para a equipe. O maior custo de patrimônio também pesou na revisão para baixo.

Porém, o banco aponta que para os investidores com visão de longo prazo, a bolsa brasileira ainda é uma boa oportunidade, caso o crescimento do PIB venha a partir de 2021, com uma expansão em torno de 5,5%.

Os analistas do banco afirmam que os líderes estão mais preparados para enfrentar a possível recessão atual e que, em períodos de incerteza como o atual, recomendam que os investidores protejam seus portfólios escolhendo empresas que possam enfrentar a crise e, eventualmente, conquistem em uma posição relativa mais forte adiante.