Correio Braziliense, n. 21819, 12/12/2022. Política, p. 2

Teste de fogo para a cerimônia da posse

Ingrid Soares


A preocupação com a segurança na posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é crescente. A diplomação de Lula e do vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB), hoje, no Tribunal Superior Eleitoral (TSE), contará com esquema reforçado e deve ser um teste de fogo para a posse em 1º de janeiro.

A futura primeira-dama, a socióloga Rosângela da Silva, a Janja, que coordena a cerimônia de posse, evitou revelar de onde o petista deverá sair com o carro oficial a caminho da rampa do Palácio do Planalto, quando comentou sobre os preparativos com jornalistas na semana passada. No entanto, ela adiantou que o desfile durante o trajeto deverá ser feito de carro aberto.

Em comparação com as posses anteriores, especialistas apontam maior preocupação com o plano em torno do evento, levando em consideração a tensão pós-eleição de um eleitorado dividido e eventuais protestos, provocações e ataques de extremistas de direita.

As declarações do presidente Jair Bolsonaro (PL), no último dia 9, também acenderam o sinal de alerta por conta do discurso ambíguo e inflamado, onde disse que “nada está perdido”, emendando que é a população quem decidirá seu futuro e o das Forças Armadas. O temor é de que as falas sejam vistas como um aval para os apoiadores mais inflamados, que podem causar tumulto nos eventos relacionados à diplomação e à posse de Lula e de Alckmin.

“Quem decide o meu futuro, para onde eu vou, são vocês. Quem decide para onde vão as Forças Armadas, são vocês. Quem decide para onde vai a Câmara, o Senado, são vocês também”, disse Bolsonaro após quase 40 dias sem pronunciamentos públicos e na mesma data em que Lula anunciou os primeiros nomes de ministros do novo governo.

Sobre pedidos antidemocráticos para que as Forças Armadas impeçam a posse de Lula, Bolsonaro rebateu: “Não é eu que autorizo não. É o que eu posso fazer pela minha pátria. Não é jogar a responsabilidade para uma pessoa. Eu sou exatamente igual a cada um de vocês que está aqui. De carne, unha e sentimento”.

 

União de forças

Na semana passada, Janja citou que forças de segurança, como a Polícia Federal, Polícia Militar do Distrito Federal e demais órgãos que atuam na segurança pública, como o Gabinete de Segurança Institucional (GSI), estão envolvidas no esquema do dia da posse. Questionada sobre eventuais ataques, evitou alardes. “Estamos trabalhando em conjunto para que tudo transcorra da maneira mais tranquila possível, não estamos prevendo nenhum problema”. Ela apontou a expectativa de recorde de público, em torno de 300 mil pessoas, além da presença em peso de chefes de Estado para a cerimônia de posse.

Os integrantes das forças e da equipe transição também têm se reunido com o governo do Distrito Federal. A Polícia Federal prevê a ação de mais de 700 agentes, vindos inclusive de outros estados, barreiras de revista, atiradores de elite, sistema anti drone, além da proibição de acesso de veículos nas vias da praça dos Três Poderes.

Na posse, segundo o cronograma divulgado pela transição, por volta das 14h30, Lula seguirá para o Congresso, onde será recebido pelos presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) para o ato que oficializa a posse presidencial, com pronunciamento e transmissão da faixa. Posteriormente, subirá a rampa do Palácio do Planalto para a tradicional troca de faixa e por fim, se encaminhará ao Palácio do Itamaraty, por volta das 18h30, onde receberá cumprimentos de chefes de Estado. Já os shows previstos no Festival do Futuro, com mais de 20 artistas, devem começar assim que terminar a posse oficial no Planalto.

Protocolo

Na diplomação de hoje no TSE, conforme o rito do tribunal, Lula deverá se pronunciar, mas não há previsão de entrevista aos jornalistas no término da cerimônia. A Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP/DF) elaborou um Protocolo de Operações Integradas (POI) para o evento. O policiamento será reforçado em toda região pela Polícia Militar do DF (PMDF). Unidades especializadas da corporação, como as tropas de choque, cavalaria, operações aéreas, policiamento com cães e operações especiais, estarão no local para apoio. Além desse reforço, o local contará com segurança própria, feita pela Polícia Judicial.

Já o Departamento de Trânsito do DF (Detran) atuará no controle e organização do fluxo nas proximidades do Tribunal. As vias nas imediações do TSE serão fechadas e protegidas por gradis. A reabertura para trânsito de veículos será feita após o término do evento e avaliação das autoridades de segurança pública.

Para maior celeridade aos atendimentos de ocorrências e na prestação de serviços durante o evento, será montada uma Cidade da Segurança, ao lado do TSE. A estrutura dará apoio aos agentes durante a operação.

Na avaliação do cientista político Rodrigo Prando, professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, comparado a outras posses, com o resultado apertado do segundo turno, há possibilidade de manifestações ou mesmo atentados. “Há um conjunto de fake news e teorias da conspiração que alimentam os mais radicais. Assim, há a desconfiança do governo de transição com o GSI que entende ter sido instrumentalizado pelo bolsonarismo. Essa será uma das posses mais tensas e mais policiadas da história.”

O cientista político Cristiano Noronha, da Arko Advice, reconhece os riscos de segurança para o evento, mas alega que a escolha de Lula pelo ex-presidente do Tribunal de Contas da União (TCU) José Múcio Monteiro para chefiar o Ministério da Defesa e a definição da equipe das Forças Armadas podem ajudar a abrandar o cenário de hoje e da posse. “Sem dúvida, podem ocorrer episódios que gerem tumultos. Mas acredito que a própria nomeação de Múcio com indicação de chefes das Forças pode ajudar a diluir essa tensão, essa pressão sobre as Forças Armadas. Em relação aos manifestantes acampados, eventualmente pode ocorrer algum episódio, mas não acho que gere uma situação mais grave”, afirma.

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