O Globo, n. 32539, 08/09/2022. Política, p. 7

Em um ano, presidente “esquece” urnas, mas faz ameaças ao STF



Nos atos do 7 de Setembro no Rio e em Brasília ontem o presidente Jair Bolsonaro repetiu, em tom velado ou indireto, o discurso de ameaças ao Supremo Tribunal Federal (STF) que já adotara no ano passado, quando também incluiu xingamentos diretos a ministros da Corte. Dessa vez, o presidente não fez declaração de descredibilizar as urnas eletrônicas, como vinha ocorrendo nos últimos tempos, até uma trégua mais recente nos últimos dias.

Se em 2021, na Avenida Paulista, em São Paulo, o presidente subiu a temperatura política do país ao chamar de “canalha” Alexandre de Moraes e afirmar que não mais cumpriria decisões judiciais do magistrado — pontos do qual recuou dias depois em uma nota —, o agora oficialmente candidato à reeleição pelo PL optou por mandar recados indiretos, como ao dizer que, num segundo mandato, imporá que todos joguem “nas quatro linhas da Constituição”. Durante seu mandato, Bolsonaro várias vezes acusou ministros de saírem das “quatro linhas” por causa de decisões que não o agradaram.

As manifestações de seus aliados e apoiadores, por meio de faixas, cartazes e gritos de ordem, pediam sem meias palavras o fechamento do Supremo, a destituição de seus ministros e atacavam o processo eleitoral. Em Niterói (RJ), por exemplo, o deputado federal Carlos Jordy (PL-RJ) organizou um dos atos mais beligerantes: ao mesmo tempo em que condenavam, pelo alto-falante, a ditadura da toga, um aliado rasgava faixa com os dizeres “Fora Bolsonaro“, arrancada da Universidade Federal Fluminense (UFF).

Tanto em Brasília, pela manhã, quanto no Rio, o tom ao tratar a Corte foi o mesmo e o presidente citou que “todos sabem o que é o Supremo Tribunal Federal”.

Chamada ao voto

Em setembro de 2021, quando o percentual dos que avaliavam seu governo como ruim ou péssimo chegava a 53%, 11 pontos a mais que hoje, Bolsonaro fez um discurso antidemocrático mais contundente contra o Supremo.

Além disso, se no ano passado, os ataques às urnas eletrônicas estavam na ponta da língua do presidente, que chegou a afirmar, sem apresentar provas, que o sistema eleitoral não “oferece qualquer segurança por ocasião das eleições”, o tema não foi citado ontem por ele, que preferiu pedir a participação de seus eleitores no pleito.

— A vontade do povo se fará presente no próximo dia 2 de outubro. Vamos todos votar. Vamos convencer aqueles que pensam diferente de nós, vamos convencê-lo do que é melhor para o nosso Brasil — enfatizou em Brasília.

Atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas pesquisas, com diferença de 13 pontos, Bolsonaro optou por explorar o antipetismo que ajudou a elegê-lo em 2018 e atacou políticos e governos de esquerda, sugerindo que “esse tipo de gente” fosse “extirpada” da política. Em 2021, a oposição à esquerda teve menos espaço na fala do presidente. Na ocasião, Bolsonaro se limitou a dizer que “as cores da nossa bandeira são verde e amarelo”.

Há, contudo, tópicos citados em 2021 que permaneceram. O presidente usou nos dois momentos tom religioso, ao dizer ser um presidente que acredita em “Deus” e a destacar valores conservadores. Bolsonaro também repetiu a defesa aos aliados, alvos de operações da Polícia Federal. Desta vez, foram lembrados empresários que entraram na mira por mensagens golpistas no WhatsApp — Luciano Hang esteve ao lado do presidente em Brasília e no Rio. Em 2021, o presidente se referiu a aliados alvos de pedidos de prisão feitos por Moraes como “presos políticos”.