Valor Econômico, v. 20,
n. 4968, 26/03/2020. Brasil, p. A3
Governo estuda adiamento
de três meses para tributos federais
Fabio Graner
A equipe econômica finaliza estudos para permitir um adiamento por três meses
do prazo de pagamento dos tributos federais, com base na decretação do estado
de calamidade pública. Há discussões e pressões internas no governo para que
essa medida seja adotada. Isso ocorre na esteira de um debate que já chegou
ao judiciário - e também ocorre na área econômica - sobre a aplicação de
uma portaria de 2012 (Portaria 12/2012) que permitia às empresas localizadas em
municípios em estado de calamidade diferirem seus tributos devidos à União.
Fontes da Receita
reconhecem que a portaria está em vigor, mas ainda há dúvida sobre seu
alcance.
O debate levado à
Justiça é se o decreto estadual de calamidade é suficiente para que as empresas
usem automaticamente a portaria de número 12, editada na época do então
ministro da Fazenda Guido Mantega, mesmo se no município em que estiver sediado
não tiver sido acionada a calamidade. Estados como São Paulo, Rio de Janeiro e
Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul já decretaram calamidade pública.
O advogado Luiz Gustavo
Bichara, sócio de escritório Bichara Advogados, explica que a portaria 12
conceitualmente é um instrumento de “eficácia limitada”. Ou seja, demanda outro
normativo explicitando quem pode ter direito ao benefício. A tese jurídica que
ele e outros tributaristas empresas estão levando ao judiciário é de se
fazer aplicar automaticamente essa norma em todos os municípios daqueles
Estados com calamidade decretada. “Se o contribuinte for por conta própria
nesse momento ele será autuado”, disse.
Outro tributarista que
pediu anonimato concorda com a tese e avalia que, embora a portaria não
contemple a calamidade decretada pela União, caberia a aplicação nesse caso
também. “É provável que, por uma questão formal, eles façam um ajuste na
portaria para contemplar essa situação inusitada”, disse a fonte.
Um interlocutor da
Receita, contudo, disse que a interpretação é que não se aplicaria porque
a calamidade da União é diferente, por estar vinculada à Lei de
Responsabilidade Fiscal (LRF). De qualquer forma, na equipe econômica esse
debate sobre uma aplicação geral desse conceito está em curso e uma decisão
deve ser tomada em breve.
Entre os que defendem um
adiamento generalizado, prevalece a leitura de que o recolhimento nesses
três meses já ficaria bem abaixo do normal por conta da paralisia na economia
brasileira.
Dessa forma, o
diferimento seria um caminho para garantir caixa para as empresas nesse momento
de crise, com custo menor para o Tesouro. “A calamidade não dá um cheque em branco
para emissão de dívida pública”, salientou uma fonte. Além disso, o impacto no
ano seria limitado, dado que não é perdão de dívida tributária e isso será pago
mais à frente pelas companhias. Ou seja, é como se o governo desse um capital
de giro que será pago logo.
Na semana passada, o
governo anunciou o benefício de adiamento por três meses no recolhimento de
tributo para as empresas do Simples (sistema simplificado de recolhimento para
micro e pequenas empresas). Essa medida só atingiu a parcela dos tributos devidos
à União. Os Estados e Municípios que estão no Simples não aderiram ainda,
apesar de pressão da área econômica do governo. Governadores e prefeitos
querem contrapartida para fazer isso.