O Globo, n. 32541, 10/09/2022. Política, p. 4
Absurdo reprisado
Pollyana Araújo
O bolsonarista Rafael Silva de Oliveira, de 24 anos, foi preso preventivamente por matar a facadas e tentar decapitar o petista Benedito Cardoso dos Santos, de 42 anos, na zona rural do município de Confresa, em Mato Grosso. Todos os principais candidatos ao Palácio do Planalto falaram sobre o crime, com exceção do presidente Jair Bolsonaro, que ainda subiu o tom dos ataques, chamando o PT de “praga” e afirmando que varrerá o partido para o “lixo da história” caso seja reeleito. É o segundo assassinato por motivo político desta corrida eleitoral, depois que o tesoureiro do PT em Foz do Iguaçu (PR), Marcelo Arruda, foi morto a tiros pelo policial Jorge Guaranho, em julho. Oliveira deu 15 facadas na vítima e, depois, ainda tentou decapitá-lo com um machado na noite de 7 de setembro. Os dois são trabalhadores rurais e trabalhavam juntos no corte de lenha em uma chácara. Estavam discutindo por causa de política.
O suspeito foi identificado pelas autoridades quando foi buscar ajuda em uma unidade de saúde por conta de um corte na mão. No hospital, os funcionários acionaram a polícia e Oliveira foi levado à delegacia, onde ficou preso e confessou o assassinato por “motivação política”. Antes, a Polícia Civil foi ao local do crime, a chácara em que trabalhavam, e encontrou elementos que ligavam Oliveira ao crime. Ele então admitiu a autoria. De acordo com a Polícia Civil, durante a briga, Santos teria dado um soco no queixo de Oliveira, que revidou o golpe. Em seguida, Santos teria pego uma faca —logo tomada de suas mãos por Oliveira.
O suspeito atacou a vítima nas costas e desferiu ao todo 15 facadas contra o homem, no olho, testa e pescoço. Oliveira teria então ido a um barraco e pego um machado, com o qual desferiu o golpe fatal em Santos. Oliveira foi autuado em flagrante por homicídio qualificado por motivo fútil e meio cruel. A questão política não foi citada pelo delegado. — Segundo o próprio autor, ele deferiu aproximadamente 15 facadas. Tomei conhecimento que ele teve a prisão convertida para preventiva, então ele continuará preso pelos próximos dias — afirmou o delegado Victor Donizete de Oliveira Pereira. Na decisão da Justiça, Oliveira teve a prisão convertida para preventiva pelo crime cometido por ódio político. “Em um estado democrático de direito, no qual o pluralismo político é um dos seus princípios fundamentais, torna-se ainda mais reprovável a conduta do custodiado”, disse o juiz Carlos Eduardo Pinho Bezerra de Menezes, na decisão. O magistrado ainda destaca que a intolerância não será admitida pela Justiça: “A intolerância não deve e não será admitida, sob pena de regredirmos aos tempos de barbárie. A liberdade de manifestação do pensamento, seja ela políticopartidária, religiosa, ou outra, é uma garantia fundamental irrenunciável”.
‘Clima de ódio’
Em entrevista, Lula, candidato do PT à Presidência, criticou o que chamou de “clima de ódio estabelecido”:
— Saio triste com a notícia de que um companheiro do PT foi assassinado por um bolsonarista. É uma demonstração do clima de ódio estabelecido na eleição. Totalmente anormal. O candidato do PDT, Ciro Gomes, disse que Santos é “mais uma vítima” da violência política que ocorre no país e para a qual pediu um fim. “Mais uma vítima da guerra fratricida, semeada por uma polarização irracional e odienta que pode inundar de sangue o nosso solo. Abaixo a violência política. O Brasil quer paz!”, escreveu ele no Twitter. A presidenciável do MDB, Simone Tebet, também demonstrou preocupação:
— Este não é o Brasil que queremos, não é o Brasil que podemos aceitar. O Brasil é um país de paz, quer união. A política não é isso. A política é a arte de realizar sonhos das pessoas. Precisamos que o presidente da República dê um basta nisso. Nenhum filho pode mais dormir sem o seu pai por causa de uma briga fratricida por questões políticas. Vamos com amor e coragem construir o Brasil em outras bases. Já Bolsonaro não tocou no assunto e voltou a atacar o PT:
— Essa praga sempre está contra a população. Esse pessoal não produz nada, só gera desgraça para o povo brasileiro. Com essa nossa reeleição, pode ter certeza, varreremos para o lixo da história esse partido dito dos trabalhadores, mas na verdade é composto por desocupados — afirmou o presidente em comício em Araguatins (TO). No Twitter, Bolsonaro rebateu o ataque feito no dia anterior por Lula, segundo quem os atos de Sete de setembro, que reuniram apoiadores do presidente, pareciam uma reunião do grupo supremacista branco Ku Klux Klan. “Associar as milhões de famílias que foram pacificamente às ruas manifestar seu amor pelo Brasil no dia de nossa Independência a um grupo terrorista, racista e antissemita, como a Ku Klux Klan,é de longe a maior e mais covarde ofensa ao povo brasileiro que já vi em minha vida”, postou Bolsonaro.