O Globo, n. 32541, 10/09/2022. Política, p. 6

Levantamento liga 40 mortes a disputa política em 2022

Guilherme Caetano


Culto com tiros, troca de socos em comício, assassinato para encerrar discussão sobre o Sete de Setembro. A três semanas das eleições, incidentes evidenciam a alta agressividadeentre apoiadores dos dois candidatos que lideram a disputa presidencial, Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL). Mas um levantamento do Observatório da Violência Política e Eleitoral da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (OVPE/ UniRio) mostra que crimes violentos relacionados à política são registados desde o início do ano. No primeiro semestre de 2022, a violência política deixou 40 mortos no país.

Os casos foram identificados por meio de um monitoramento diário automatizado de veículos de mídia impressa, eletrônica e digital de todo o país. São contabilizados homicídios e também ataques violentos contra lideranças políticas ou seus familiares, incluindo políticos no exercício do mandato, ex-políticos, candidatos, pré-candidatos, ex-candidatos e assessores e funcionários públicos das esferas federal, estadual e municipal. Como os boletins são atualizado sacada trimestre, não há dados consolidados a partir de julho, mê sem que houve ocaso de maior repercussão nacional.Em Foz do Iguaçu (PR), o agente penal José Guaranho, bolsonarista, matou o guarda municipal Marcelo Arruda, petista que comemorava o aniversário em uma festa com temática do PT. Ambos estavam armados, e o assassino também foi baleado pela vítima.

‘Novo padrão’

Além das mortes, o levantamento do OVPE aponta 89 ameaças, 42 agressões, 27 atentados e quatro sequestros. Como o monitoramento começou em 2020, não é possível comparar os dados atuais com os do mesmo período de 2018, quando houve a última eleição presidencial. Os pesquisadores definem violência política como “qualquer tipo de agressão que tenha o objetivo de interferir na ação direta das lideranças políticas ”, como limitar a atuação política e parlamentar, restringir atividades de campanha, dissuadir oponentes de participar do processo eleitoral ou impedir eleitos de tomar posse. A partir dos casos identificados no monitoramento, uma equipe de pesquisadores valida os dados para descartar mortes naturais, acidentais ou sem razão conhecida.

A prisão ontem no interior de Mato Grosso do bolsonarista Rafael de Oliveira por matar a facadas o colega de trabalho Benedito dos Santos, que defendia Lula em uma discussão, ocorreu uma semana depois de o policial militar Vitor da Silva Lopes atirar na perna do assessor empresarial Davi de Souza dentro da Congregação Cristã no Brasil em Goiânia. Souza teria reclamado do discurso do pastor, que pregava aos fiéis para não votar “em vermelhos”, em referência a partidos de esquerda. Ontem, um apoiador de Lula deu um soco num ex-candidato do PRTB, que apoia Bolsonaro, em São Gonçalo (RJ). A violência sempre rondou a política no país, mas o padrão mudou, diz Felippe Angeli, gerente do Instituto Sou da Paz:

— Os autores dos atentados não são mais coronéis da política, justiceiros de uma comunidade carioca, alguém que exerce domínio local. Hoje temos a violência cometida pelo “cidadão de bem”, no sentido do cidadão comum. É o cara que passa na frente de uma festa de aniversário e decide atirar contra o aniversariante. Angeli, que estuda o acesso a armas no Brasil, diz que a polarização política não foi introduzida por Bolsonaro e que há motivação violenta em todos as vertentes ideológicas. No entanto, ele avalia que Bolsonaro introduziu a ideia da “arma como instrumento de ação política”, o que, para ele, tem influência no clima de violência política no país. Quando houve o crime em Foz do Iguaçu, Bolsonaro afirmou que não pode ser responsabilizado por atos isolados e que não incentiva violência na política.