Valor Econômico, v. 20, n. 4968, 26/03/2020. Empresas, p. B4

MP pode permitir realização de assembleia ‘virtual’

Juliana Schincariol 


A proposta de medida provisória (MP) sobre assembleias de companhias abertas em 2020 busca permitir que a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) edite regra para a realização de encontros “virtuais” de acionistas, apurou o Valor. Até o momento não há previsão em lei para assembleias 100% remotas. A discussão ganhou relevância com a pandemia do novo coronavírus.

Em paralelo, a autarquia divulgou ontem deliberação sobre flexibilização de prazos regulamentares por causa do coronavírus. A medida dilata, por exemplo, prazos para atualização cadastral, demonstrações financeiras e assembleias de fundos e relatórios como os de compliance. Não contempla, porém, prazos fixados em lei que não podem ser alterados por regulamento da CVM. É o caso de elaboração e divulgação das demonstrações financeiras e realização das assembleias. “Não é a única deliberação que estamos trabalhando. Estamos na frente legislativa com o ministério [da Economia] para tratar das companhias abertas”, disse o superintendente de desenvolvimento de mercado da CVM, Antonio Berwanger, citando a MP, em entrevista ontem após a edição da deliberação.

O Valor teve acesso ao texto da MP, enquanto estava sendo elaborado pela CVM em conjunto com o Ministério da Economia. A preocupação é que o avanço do coronavírus impeça a realização das reuniões ordinárias de acionistas que, pela lei devem ocorrer até 30 de abril. A proposta da MP diz que a assembleia será realizada, preferencialmente, na sede da empresa. Se houver necessidade de ser feita em outro local, ainda que na cidade onde a empresa está instalada, deve ser indicado com clareza, em linha com o que diz a lei das S.A. (6.404). A novidade é que poderá haver alguma exceção por parte da CVM, inclusive com a edição de regra para autorizar a realização de assembleia digital, caso de video ou teleconferência. Havia a previsão de que a proposta de MP fosse apresentada nos próximos dias, e o texto poderia sofrer ajustes.

A lei 6.404 prevê quórum mínimo para instalação de assembleia, com 25% dos acionistas com voto. Algumas deliberações dependem de presença de mais de 50% ou 66,66% dos acionistas com voto.

Sem definição sobre um possível adiamento, algumas empresas cancelaram os conclaves. Na terça, o IRB divulgou comunicado dizendo que os acionistas poderiam acessar a reunião por uma plataforma de teleconferência, desde que se credenciassem.

O escritório Stocche Forbes orienta que as companhias adotem procedimentos usuais para realização das assembleias. Caso eventualmente o encontro não seja realizado, poderia comprovar à CVM que não aconteceu por ‘força maior’, diz a advogada Alessandra Zequi. “Hoje ainda não há regulação específica sobre como fazer esse processo remoto”, disse. Há dúvidas sobre como seriam tomadas assinaturas e confirmação de voto.

Para o sócio do CSA Chamon Santana Advogados, Ricardo Amorim, a assembleia de credores da Odebrecht pode ser um teste. Decisão judicial autorizou que fosse realizada de forma totalmente remota. “Pode ser um modelo para CVM observar como vai aplicar nas sociedades de capital aberto.”