Valor Econômico, v. 20, n. 4969, 27/03/2020. Brasil, p. A5

Área econômica quer cortar salário de todos os servidores

Ribamar Oliveira 


A área econômica do governo deseja que o corte de salários, que está previsto em uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) em negociação no Congresso Nacional, atinja não apenas os servidores, mas também os membros dos Poderes, como juízes, procuradores, promotores, ministros, deputados e senadores, prefeitos, governadores e militares, além de inativos e pensionistas. Ficariam de fora apenas aqueles com remuneração mais baixa. “Deve pegar todo mundo. Ou uma parte mora em um país rico que não conhecemos?”, questionou graduado assessor do Ministério da Economia.

A posição do governo é uma resposta à forte reação contrária à PEC que está ocorrendo entre os funcionários da Esplanada dos Ministérios e suas entidades representativas, pois, na versão que vazou para os jornais, o corte atingiria apenas a remuneração dos servidores, deixando de fora os membros dos Poderes.

Para a fonte, só haverá uma discussão séria e profunda sobre a atual crise provocada pelo avanço da covid-19 no país se a questão do controle de gastos com pessoal for enfrentada pela sociedade. O corte nos salários do funcionalismo é considerado essencial pela área técnica do governo para que União, Estados e municípios possam enfrentar o elevado custo das ações de combate aos efeitos da epidemia do novo coronavírus.

A PEC é de iniciativa de lideranças políticas e conta com o apoio do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Atualmente, existem várias versões circulando, com linhas de corte variadas, ou seja, definições diferentes para o nível de remuneração que não teria nenhum desconto. A redução varia de 20% a 30%, dependendo da versão da PEC, e a faixa salarial que ficaria isenta varia de R$ 6.032,73 (que é o teto do INSS) a R$ 10 mil.

O corte na remuneração valeria até 2024, a partir do segundo mês de vigência da PEC, e seria aplicado a todos os funcionários públicos da União, Estados e municípios e aos membros dos t servidores ligados à área de saúde e os policiais não seriam atingidos pela nova regra, quaisquer que sejam suas remunerações.

Ontem começou a circular a ideia de um projeto de lei complementar para instituir um empréstimo compulsório, em substituição ao corte de salários do funcionalismo. A proposta foi formulada por entidades ligadas aos servidores e ganhou apoio de vários parlamentares. Os defensores da proposta argumentam que o empréstimo seria pago por aqueles com renda mais elevada, independentemente do cargo que possam ocupar na administração pública ou nas empresas.

A área econômica não gosta da proposta, pois avalia que ela representa uma dívida que o governo terá que pagar no futuro. Nesse sentido, pode representar, inclusive, uma transferência do custo da crise para as futuras gerações. “Empréstimo compulsório é como se alguém, funcionário público ou não, emprestasse ao governo”, explicou uma fonte. “Isso é dívida da União”, ponderou. “Qual a diferença em fazer um empréstimo compulsório e em vender um título? Nenhuma.”

Na avaliação da fonte, a única vantagem do empréstimo compulsório seria se a taxa de juros real fosse zero. “Não sendo este o caso, o empréstimo compulsório é equivalente ao Tesouro ir ao mercado e se endividar”, explicou.