Valor Econômico, v. 20, n. 4969, 27/03/2020. Empresas, p. B6

MP defende pagamento de dividendo semestral

Juliana Schincariol


Duas propostas de medidas provisórias (MPs) que miram o adiamento de assembleias em 2020 preveem que, em caso de postergação, o conselho de administração ou a diretoria da companhia poderá declarar dividendos sem precisar reformar o estatuto. A sugestão foi incluída no momento em que empresas consideram rever a remuneração aos acionistas. O cenário é de incertezas sobre a amplitude da crise do coronavírus e a necessidade de caixa das companhias. A expectativa é que uma MP seja editada até segunda-feira.

A possibilidade consta na proposta de MP apresentada pela Associação

Brasileira das Companhias Abertas (Abrasca). Também foi incluída no texto da MP do Ministério da Economia, que conta com a participação de órgãos como a Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Nesse caso, a proposta visa a oferecer a oportunidade de pagar dividendo aos acionistas em caso de lucro semestral ou referente a períodos inferiores a um ano, ainda que no exercício de 2019, mas limitados às reservas de capital. Também consideraria dividendo a conta de lucros acumulados ou reservas de lucro existentes. Todas essas condições estão em linha com o artigo 204 da Lei das S.A.

Luiz Antonio Campos, sócio do BMA Advogados, diz que há empresas que podem ter clareza ou convicção de que sua situação permite o pagamento de dividendo sem comprometer o caixa. “Há companhias que serão mais afetadas e não é conveniente ou recomendável que distribuam dividendo”, afirma, lembrando que é possível adiar. A Petrobras remarcou o pagamento, de 20 de maio para 15 de dezembro.

A maioria das companhias brasileiras tem controladores definidos que, em alguns casos, exercem forte influência sobre diretores e conselheiros. “Permitir que dividendos sejam declarados pelos executivos pode possibilitar que o façam para atender interesse dos controladores, que vão receber a maior parte, em prejuízo da companhia”, diz o economista e especialista em regulação financeira Vicente Camillo. A orientação agora é utilizar o caixa com parcimônia, afirma um advogado. “Não visualizo uma companhia pagar dividendos neste momento sem ser para o controlador”, afirma.

Camillo acredita que, neste momento, os recursos poderiam ser alocados em programas de recompras de ações. Seria possível aproveitar a ampliação dos prazos em eventual adiamento de assembleias, para definir mais à frente a distribuição dos proventos. “A bolsa pode se recuperar nesse período. Assim haverá ganhos de tesouraria e de receita financeira”, diz.

Enquanto não há definição para adiar assembleias, empresas e advogados discutem cenários. Realizar um encontro remoto seria a opção ideal, defende o advogado Carlos Augusto Siqueira, do Cescon Barrieu. Uma alternativa, segundo ele, seria discutir deliberações via teleconferência e usar o boletim de voto a distância. “A pessoa pode debater na assembleia virtual e exercer o voto depois”.