Correio Braziliense, n. 21828, 21/12/2022. Cidades, p. 14

De olho no Fundo Constitucional

Ana Maria Campos


Cobiçado por políticos de todo o país, o Fundo Constitucional do Distrito Federal volta e meia aparece na mira de alguma medida para extinção ou pelo menos redução. A verba que em 2023 chegará a R$ 22,9 bilhões entrou no foco do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) que apresentou uma proposta de emenda constitucional (PEC) decretando a distribuição dos recursos para todas as unidades da Federação, exclusivamente para as áreas de saúde e educação, de acordo com critérios do Fundo de Participação dos Estados e do Distrito Federal (FPE).

A reação dos políticos do Distrito Federal foi gigante. A senadora Leila Barros (PDT-DF) conversou com Randolfe, mostrando a gravidade da questão. O deputado distrital Chico Vigilante (PT) gravou um pronunciamento nas redes sociais em que considerou a proposta “criminosa, insana e inaceitável”. Chegou a dizer que romperia com o PT se o partido abraçar a causa.

A proposta não é inédita, mas chamou a atenção neste momento em que o Congresso discute remanejamento de recursos para ações sociais e especialmente por ter partido de Randolfe, que fala com a autoridade de quem foi um dos coordenadores da campanha do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva.

Mas Randolfe recuou. A assessoria do senador disse que ele retirou a PEC da tramitação para reavaliação. Contava até ontem com quatro assinaturas. Para andar na Casa, uma proposta de emenda constitucional depende de 27 assinaturas.

A obrigação federal de manter financeiramente as forças de segurança do DF está prevista na Constituição de 1988 e o Fundo Constitucional foi aprovado como lei no fim do governo de Fernando Henrique Cardoso, em dezembro de 2002. Foi uma luta dos políticos do DF, especialmente o então governador do DF, Joaquim Roriz.

O então deputado federal Pedro Celso (PT) foi o relator do projeto de lei. Uma emenda do então deputado Geraldo Magela (PT) estabeleceu que a correção do valor do fundo se dá pela variação da receita corrente líquida do governo federal. “Isso faz com que a correção quase sempre seja maior do que a inflação do ano”, afirma Magela.

Para Magela, a PEC foi um erro. “O senador Ranfolfe errou ao apresentar proposta para revogar o fundo. E fez isso sem consultar ninguém do DF”, diz o petista, que coordenou a campanha de Lula no Distrito Federal.

Antes da lei, cada repasse do governo federal para a capital do país exigia uma árdua negociação política e dependia da boa relação entre a Presidência da República e o Palácio do Buriti.

Hoje o Fundo Constitucional é mais do que nunca essencial. O governo do Distrito Federal não tem condições de manter, com arrecadação própria, as áreas de saúde, segurança e educação sem os repasses federais.

O Fundo Constitucional representa 40% do orçamento total do DF. São R$ 34,4 bilhões de arrecadação própria e R$ 22,9 bilhões do Fundo Constitucional, num total de R$ 57,3 bilhões, segundo o orçamento de 2023.

Na justificativa, Randolfe apresentou seu ponto de vista: “Não se desconhece a relevância do FCDF. Contudo, concebe-se que ele teve sua importância histórica nos primórdios da redemocratização do país, em que foi necessário o fortalecimento do aparato estatal no Distrito Federal, escolhido como o lócus para a capital do país e seus intrínsecos efeitos econômicos. Mais de 30 anos depois da previsão constitucional do fundo e passados 20 anos de sua instituição legal, inclusive para setores não inicialmente previstos pelo legislador constituinte, entende-se que ele cumpriu o seu papel de fortalecer a prestação de serviços públicos no Distrito Federal, que é hoje uma das unidades da Federação com maior renda per capita e com maior IDH, além de menores índices de criminalidades”.

Randolfe ressalta que o DF mantém um orçamento “folgado”, enquanto outros estados “se apertam ao extremo para garantir o fechamento das contas públicas”.

Para Chico Vigilante, a proposta inviabiliza as contas da capital do país. Pelas redes sociais, Vigilante disse: “Você tem noção exata, senador Randolfe Rodrigues, do mal que você quer causar à população do Distrito Federal? Essa proposta de emenda à Constituição, senador Randolfe, é um crime contra mais de três milhões de moradores da capital da República. É inaceitável essa sua proposta, senador Randolfe Rodrigues”.

 O Fundo Constitucional do DF para 2023

Segurança Pública R$ 10.196.975.688,00

Saúde R$ 7.144.401.762,00

Educação R$ 5.630.274.890,00

Total R$ 22.971.652.340,00