Valor Econômico, v. 20, n. 4970, 28/03/2020. Política, p. A12

Guedes reaparece e diz que continua no cargo

Estevão Taiar
Fernando Exman
Marcelo Ribeiro
Camila Souza Ramos


O ministro da Economia, Paulo Guedes, ressurgiu no fim de semana, após permanecer ausente dos anúncios, entrevistas coletivas e eventos públicos promovidos pelo governo sobre o coronavírus. Guedes participou de uma série de reuniões virtuais, transmitidas pelas redes sociais, para afirmar que permanece no governo. O ministro ouviu demandas de representantes do mercado e de prefeitos, e prestou esclarecimentos sobre os seus planos para combater os efeitos da pandemia.

A primeira transmissão foi organizada pela XP Investimentos, quando Guedes garantiu que não pretende deixar o governo. “Isso é conversa fiada total”, disse. “Como vou deixar o país no momento mais grave?”, questionou, emendando: “Isso é conversa de oposição, boataria.”

Guedes afirmou que o país vai gastar valores próximos a 5% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2020 para combater os impactos econômicos da pandemia. Mesmo assim, assegurou, depois será retomado o ajuste fiscal. “Vamos gastar bastante, 4,8%, 5% do PIB neste ano, mas depois voltamos à nossa estratégia.”

O ministro pediu que os empresários esperem as medidas que serão anunciadas antes de demitir. E afirmou ser contra a redução dos salários dos servidores públicos ou outras medidas “deflacionárias”. O melhor, disse, seria se chegar a um acordo com o funcionalismo para que não ocorram novos reajustes dos vencimentos nos próximos anos.

“Já que setor privado foi para o desemprego, para a dificuldade, foi para o auxílio emergencial, o funcionário público que está em casa, no isolamento, recebendo salário integral, então pelo menos contribua com o Brasil. Quebra essa espiral de aumentos pelo menos dois, três anos”, disse. “Acho mais construtivo do que tentar tirar poder de compra.”

Guedes também aproveitou para acenar aos seus interlocutores do dia seguinte, os prefeitos, afirmando que o governo federal irá rolar as dívidas dos municípios.

Ontem, foi a vez de Guedes se reunir virtualmente com integrantes da Frente Nacional de Prefeitos (FNP) e da Confederação Nacional de Municípios (CNM). Aos gestores, indicou que o Ministério da Economia ainda avalia qual a melhor opção para operacionalizar o auxílio mensal de R$ 600 a trabalhadores informais. Guedes apresentou duas alternativas: que as administrações municipais compartilhem com a União os cadastros locais de cidadãos vulneráveis; ou que as próprias prefeituras paguem o benefício e depois sejam ressarcidas pelo governo federal. “Precisamos ter certeza de que o dinheiro chegue o mais rápido possível [aos trabalhadores]”, disse.

Atualmente, o Cadastro Único da União cobre apenas de 15% a 20% dos trabalhadores informais do país, segundo o ministro. “À medida que os senhores enviarem seus cadastros para o INSS e a Caixa, vamos ampliando [essa cobertura]”, disse. Guedes ressaltou, porém, que mesmo os informais fora das listas do Cadastro Único, Bolsa Família e Benefício de Prestação Continuada (BPC) poderão sacar os R$ 600. “Se chegar sem cadastro nenhum e pedir, vai receber”, disse.

Em reunião com a Frente Nacional de Prefeitos, Guedes sugeriu que as administrações municipais que tiverem condições adiantem os recursos, e depois “mande a conta”. “Vamos deduzir isso depois.”

Para o ministro, a insegurança jurídica torna mais difícil que União, Estados e municípios combatam os efeitos do coronavírus. O ministro afirmou que articula com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), um projeto que torna temporariamente mais flexível parte da legislação fiscal. “Nosso problema hoje é LRF (Lei de Responsabilidade Fiscal), é pedalada fiscal, é impeachment”, disse. “É evidente que precisamos ter uma cláusula qualquer de calamidade pública que suspenda [algumas regras], que nos dê o direito de agir rapidamente. Estou com vários secretários que dizem: não posso assinar isso, senão vou preso. Isso é razão de impeachment com o presidente depois etc.”

O ministro disse que o governo estenderá as linhas de redesconto para empresas de máquinas de pagamento, a fim de evitar que recursos do sistema financeiro fiquem parados nos grandes bancos. O redesconto é uma linha de financiamento para instituições financeiras, que buscam crédito no Banco Central e deixam, como garantia, títulos públicos. “Às vezes a liquidez fica empoçada”, disse.