Valor Econômico, v. 20, n. 4970, 28/03/2020. Finanças, p. C3

Possibilidade de ampliar compra de título público pelo BC é avaliada

Fabio Graner


O governo considera incluir na Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que visa dar autorização para o Banco Central (BC) adquirir créditos privados a possibilidade de ampliar as modalidades de compras de títulos do Tesouro Nacional.

Há dúvidas sobre qual será o alcance da medida, caso o governo decida avançar nessa direção. Atualmente, o BC pode comprar títulos diretamente do Tesouro Nacional apenas para rolagem de sua carteira utilizada nas operações compromissadas e, no mercado secundário, para o processo de regulagem de liquidez e para garantir a taxa básica de juros Selic no nível pré-definido pelo Copom (Comitê de Política Monetária).

Uma fonte da área econômica disse que a discussão no governo era mais voltada para a atuação do BC no mercado secundário de títulos do Tesouro em momentos de crise, como a atual. Na prática, daria mais segurança jurídica para o BC atuar na parte longa da curva de juros, garantindo liquidez.

Outro interlocutor, contudo, pondera que em tese o BC já pode fazer isso, está previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Mas na prática a atuação da autoridade normalmente está direcionada para regulagem da liquidez de curto prazo e manutenção da taxa Selic no nível definido pelo Copom, e não nas taxas longas, que subiram muito recentemente.

Essa mesma fonte do governo aponta que a medida poderia ser direcionada para a compra de títulos do Tesouro no mercado externo, para poder dar liquidez a alguns bancos, o que hoje não é feito. E também para deixar claro que poderia comprar títulos do Tesouro também de empresas não financeiras no mercado interno. Nesse caso, a fonte se posiciona contrariamente por considerar que o papel do BC é garantir a solvência do sistema financeiro e não das demais empresas.

Em uma versão da PEC que circulou no Congresso e no governo, o texto previa retirar a limitação de compra direta de títulos do Tesouro pelo BC em períodos específicos, como calamidade pública. Ou seja, criaria  possibilidade de o BC financiar o Tesouro, o que hoje é vedado pela Constituição.

Uma fonte aponta ainda que seria importante que, se a medida fosse adiante, que ela ficasse circunscrita a essa crise específica e com limites claros para a atuação do BC. “É um baita poder na mão do BC, com reflexos sobre a dívida. Tem que ser excepcional”, disse.

Outro interlocutor ressalta que permitir ao Banco Central comprar diretamente do Tesouro tem riscos e pode gerar tumulto no mercado.

A fonte lembra que o Federal Reserve (Fed, o banco central americano), modelo de atuação nesses momentos, nunca compra diretamente do Tesouro dos Estados Unidos e lembra da operação chamada de “Twist”, de 2012/13, na qual a autoridade monetária daquele país atuou no secundário para segurar a alta nas taxas de longo prazo.