Correio Braziliense, n. 21809, 02/12/2022. Política, p. 4 
 
Sem capacidade de investir 

Tainá Andrade 
 
 
A fusão dos ministérios da Integração Social e das Cidades para formar o Ministério do Desenvolvimento Regional no governo de Jair Bolsonaro (PL), cassou a capacidade da pasta de administrar o próprio orçamento — abrindo mão do poder de organizar e planejar a aplicação dos recursos. As conclusões são do Grupo Técnico de Desenvolvimento Regional do governo de transição.   

O ministro Daniel Ferreira deixará a pasta com 64% do orçamento total para o próximo ano destinado às emendas — de relator, de bancadas ou individuais. Desses recursos, R$ 4,4 bilhões são apenas para o chamado orçamento secreto. Isso representa que as despesas discricionárias — nas quais o ministério aloca recursos conforme a necessidade — foram reduzidas em 82%.  

“O ministério tem que garantir que sejam olhadas as desigualdades regionais no país. O aspecto é que, além da desorganização, há a falta de integração das políticas públicas. Em 80%, os fundos de desenvolvimento foram investidos em cidades com alto índice de desenvolvimento. Isso mostra que não existe uma estratégia (do governo Bolsonaro) para reduzir as desigualdades”, criticou o ex-governador do Ceará, Camilo Santana.   

No levantamento feito pelo setorial, foram encontradas, por exemplo, grandes quantias aplicadas apenas em pavimentações — R$ 1,9 bilhão das emendas de relator foram para asfaltamento. “Existem recursos demais para pavimentações sem critérios, distribuição de trator, de caixas d’água sem água. Enquanto isso, o objetivo-fim do ministério não é alcançado. A pasta é um verdadeiro cemitério de trabalhos parados. Se continuar desse jeito, 50% das obras de saneamento do país estarão paralisadas”, alertou o senador e coordenador do grupo de trabalho, Randolfe Rodrigues (Rede-AP).   

Excesso   

A distorção na aplicação de recursos da União foi razão de alerta do Tribunal de Contas da União (TCU) — que chamou a atenção para o fato de que 80% das ações do Ministério do Desenvolvimento Regional estão concentradas em regiões com alto índice de desenvolvimento econômico.   

Em contrapartida ao excesso de aplicação de recurso em uma só rubrica, houve falta de investimentos em Defesa Civil — leia na página 6 os primeiros efeitos dos desastres naturais em seis estados —, Habitação e Segurança Hídrica. Para o próximo ano, o buraco no orçamento da pasta é de mais de R$ 3,2 bilhões para ações que já estão em curso.   

O relatório preliminar do grupo de trabalho salienta, ainda, que as obras do programa de habitação popular terão de ser paralisadas já em fevereiro por falta de previsão orçamentária. No caso da Defesa Civil, não há um planejamento para prevenção e resposta a desastres para o fim deste ano e o início do próximo — temporada cujo histórico é de deslizamentos, enchentes e mortes causadas pelas fortes chuvas.