Valor Econômico, v. 20, n. 4971, 31/03/2020. Especial, p. A16

Déficit será de 4,5% do PIB, prevê Tesouro

Mariana Ribeiro
Edna Simão 


Com as medidas emergenciais que serão adotadas para conter os efeitos da pandemia do coronavírus na economia, o governo central (Tesouro Nacional, Previdência Social e Banco Central) deve fechar o ano com um déficit primário superior a R$ 350 bilhões (4,5% do PIB), informou ontem o Tesouro. Se confirmado, será o pior resultado anual da história. A meta para este era de um rombo de R$ 124,1 bilhões, mas com a decretação de estado de calamidade pública o governo está livre para descumprir esse resultado.

Caso o rombo nas contas de Estados e municípios fique em R$ 30 bilhões, o déficit do setor público consolidado (governo federal, Estados, municípios e estatais) vai se aproximar de R$ 400 bilhões, o que corresponde a mais de 5% do PIB - ante déficit primário de R$ 61 bilhões (0,9% do PIB) no ano passado.

Em fevereiro, o resultado primário do governo central foi deficitário em R$ 25,857 bilhões, resultado de um déficit de R$ 7,611 bilhões do Tesouro Nacional e de R$ 18,271 bilhões da Previdência Social e um superávit de R$ 25 milhões do Banco Central (BC). Foi o déficit mais alto para o mês em três anos. A receita líquida teve queda real de 7,2% em relação ao mesmo mês de um ano antes. Já as despesas totais cresceram 0,5% na mesma comparação.

Apesar do resultado negativo no mês passado, o secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, avisou que o pior ainda está por vir. As medidas de combate à crise ainda não impactaram os números de fevereiro. Será entre abril e junho que as ações emergenciais tomadas para minimizar os efeitos da pandemia sobre a economia terão um efeito mais forte sobre as contas públicas. Segundo o secretário, a estimativa de déficit para o ano será reavaliada pela equipe econômica a cada semana. “Vamos ser transparentes.”

Mansueto destacou que as medidas de combate à crise, como o auxílio para informais e o reforço ao Bolsa Família, são necessárias. Pontuou, no entanto, que o país precisa ter cuidado para que “despesas temporárias não se tornem permanentes”. É necessário separar o déficit “conjuntural” do “estrutural”, completou. Segundo o Tesouro, enquanto a expansão da despesa ficar restrita a este ano, não haverá problemas para a retomada do ajuste fiscal.

O secretário admite também que o Produto Interno Bruto pode ficar negativo neste ano, como já projetam alguns economistas. A projeção atual é de estabilidade, em 0,02%. “Vamos passar por um período difícil.” Segundo ele, a programação orçamentária para o ano mudará “radicalmente” nos próximos meses. Será preciso também a revisão da insuficiência para cumprimento da “regra de ouro”.

O secretário afirmou que decisão liminar do Supremo Tribunal Federal (STF) que flexibilizou o cumprimento da Lei de Responsabilidade Fiscal (LFR) e da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) dá tranquilidade para adoção de medidas emergenciais, mas que isso não dispensa a aprovação da PEC do chamado “orçamento de guerra”. Segundo ele, com a decisão, as estimativas de impacto de novos gastos ainda serão divulgadas, mas que, no momento, não se pode “passar meses” discutindo a exatidão dos valores. “Temos que ser rápidos.”

Ao defender a PEC do “orçamento de guerra”, que regulamenta toda a regra fiscal para calamidade pública, ressaltou a importância do bom diálogo com o Congresso para que a medida, que é estrutural, seja aprovada.

Questionado sobre a demanda de prefeitos pelo adiamento do pagamento de precatórios, disse que o tema deve ser tratado no ambiente do Congresso. Já sobre o pedido de alguns Estados para não pagarem obrigações com a União, afirmou que “decisão judicial não se discute”, mas que é preciso diálogo entre as partes.

Em relação à LDO de 2021, que deve ser enviada até 15 de abril, disse que as reuniões devem começar apenas no fim desta semana e que, no momento, é “difícil apontar cenários claros” para os anos seguintes.