Valor Econômico, v. 20, n. 4972, 01/04/2020. Política, p. A8

Demora em sancionar auxílio gera tensão entre governo e Congresso

Renan Truffi
Marcelo Ribeiro
Isadora Peron
Mariana Ribeiro
Fabio Murakawa
Rafael Bittencourt


A lentidão do governo em sancionar o auxílio emergencial de R$ 600 destinado a trabalhadores informais, autônomos, intermitentes e pessoas com deficiência opôs, mais uma vez, Legislativo e Executivo. O Congresso aguarda para saber se o texto será confirmado pelo Palácio do Planalto na forma como ele foi aprovado pelos congressistas enquanto o presidente Jair Bolsonaro já sinaliza que pode vetar alguns dos dispositivos previstos.

“Estamos correndo atrás porque tem vetos que precisam ser analisados e justificados, não é só botar um ‘x’ não”, explicou Bolsonaro, após ser cobrado sobre a liberação da ajuda. O ministro da Economia, Paulo

Guedes, sinalizou ontem, entretanto, que o problema também é de “fonte de recursos” para executar o pagamento, mas disse que as “medidas aprovadas estão avançando”.

“É rito burocrático, estamos lidando com recursos públicos. Se fosse nosso, botávamos a mão no bolso e estava ali em 30 minutos. Isso mais tarde é pedalada fiscal, é impeachment”, disse. Segundo ele, o auxílio vai custar de R$ 60 bilhões a R$ 80 bilhões e, por isso, pediu compreensão. “Não é trivial colocar dinheiro na mão de mais de 38 milhões de pessoas.

Apesar disso, Guedes também deu a entender que a liberação dos recursos depende de uma série de medidas, entre elas a aprovação de uma PEC pelo Congresso. “O presidente da Câmara, Rodrigo Maia, pode ajudar muito se ele encaminhar e aprovar em 24 horas uma PEC emergencial que regulariza isso”, explicou. Segundo ele, com isso, o dinheiro sairá “rapidamente”. Guedes também cutucou os parlamentares ao dizer que não é hora de haver cobrança entre os Poderes por um pagamento mais célere. “Há toda uma logística, dinheiro não cai do céu. A hora é de união, nós brasileiros temos que estar juntos”, complementou.

Por outro lado, o ministro procurou contemporizar. Disse que é natural haver “desencontros” entre as ações do governo e do Congresso, mas que não iria criticar os parlamentares. “Jamais usaria uma oportunidade para falar mal do Congresso”.

As declarações não foram bem recebidas pela cúpula do Parlamento. Nos bastidores, líderes partidários avaliaram como “chantagem” a argumentação do ministro do governo. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), foi mais enfático: afirmou, em plenário, que Guedes tenta jogar a responsabilidade sobre a falta de ações de sua Pasta nos outros. Na avaliação dele, se o pagamento dos R$ 600 por trabalhador informal depender, de fato, de uma proposta de emenda constitucional, então Guedes “mentiu” ao Supremo Tribunal Federal (STF) ao pedir liberdade para executar despesas excepcionais em razão da crise.

“Não estou aqui para transferir responsabilidade para ninguém. Estou para construir, junto com os deputados, soluções para a crise. Se ele estiver certo hoje, o governo mentiu na ação que impetrou no Supremo Tribunal Federal”, disse Maia. Do lado do Senado, os parlamentares já preparam o projeto para estender o benefício para pelo menos oito categorias de trabalhadores, além de indígenas.