Valor Econômico, v. 20, n. 4972, 01/04/2020. Brasil, p. A3
Governo adia alta nos medicamentos
Adriana Mattos
Ana Paula Machado
O
presidente Jair Bolsonaro informou, por meio de redes sociais, o adiamento de
reajuste de todos os medicamentos por 60 dias, após “comum acordo com a
indústria farmacêutica”. Com isso, novas tabelas de preços que seriam aplicadas
já a partir de hoje foram postergadas para junho. O reajuste médio, já definido
há algumas semanas, será de 4,08%.
A
decisão foi tomada após divergências entre ministérios sobre o assunto, e num
ambiente também de discordâncias entre fabricantes e varejistas, apurou o
Valor.
Questionado
sobre o assunto, o Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos
(Sindusfarma) disse que a entidade não foi consultada. O Valor apurou que a
indústria já havia alertado o governo sobre a necessidade do reajuste nos
medicamentos por causa de pressões nos seus custos com a alta do dólar, em
reunião de março entre empresários e Bolsonaro. Já varejistas do setor de
farmácias, na mesma reunião, se posicionaram contra os aumentos neste momento.
Anualmente,
em março, a Câmara de Regulação de Mercado de Medicamentos da Anvisa (CMED)
oficializa o reajuste que vigora em abril. Até o fim da semana passada, redes e
indústrias tinham informação da CMED que só não seria aplicado o reajuste em
medicamentos ligados à covid-19, e todos já trabalhavam com essa expectativa.
Mas
o risco de que um aumento generalizado afetasse a imagem do governo num momento
de crise fez o governo rever a posição inicial, diz uma fonte.
Os
ministérios da Economia, da Saúde e da Justiça defendiam o repasse imediato a
todos os itens, menos aos ligados à covid-19. A expectativa era anunciar a
decisão até, no máximo, a sexta-feira da semana passada, para dar alguma
previsibilidade ao setor.
Mas
nos últimos dias a Casa Civil passou a defender posição contrária - não
reajustar nenhum medicamento neste momento, pela sensibilidade do tema, diz uma
segunda fonte consultada.
Durante
toda a tarde de ontem havia expectativa de publicação de medida provisória
sobre o tema. No fim do dia, o Valor apurou que o adiamento poderia ser de até
180 dias. “No fim, achamos um meio-termo, não tão ruim aos fabricantes ou às
farmácias”, diz fonte que participou das negociações.
O
Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos (Sindusfarma) disse que,
diferentemente do que sinalizou o governo, não foi consultado sobre o
adiamento. Segundo o presidente do Sindusfarma, Nelson Mussolini, ainda não há
informação se essa medida será tomada por meio de MP ou não.
O
preço dos medicamentos é controlado há cerca de 15 anos e o reajuste é anual.
Na visão dos fabricantes, o reajuste médio repassou uma parcela da valorização
do dólar, de cerca de 30% desde janeiro.
Antes
mesmo da decisão final, algumas varejistas, como Raia Drogasil e Drogaria
Venâncio já haviam tomado a decisão de suspender o aumento nos preços. A
Abrafarma, que reúne as redes de drogarias, considera acertada a decisão do
governo de adiar os reajustes pelo momento atual de crise econômica. “Nosso
apoio é integral à decisão do governo, desde o início das negociações, das
quais participamos ativamente. O reajuste é legítimo e devido, pois repõe
perdas e custos do setor produtivo. o momento é de solidariedade e
colaboração”, disse Sergio Mena Barreto, presidente da Abrafarma.