Título: Cientista admite violação de ética
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Fonte: Jornal do Brasil, 25/11/2005, Internacional, p. A16

O cientista sul-coreano Hwang Woo-Suk, pioneiro nos estudos em clonagem, pediu desculpas ontem, em uma coletiva, após admitir ter utilizado óvulos comprados de pesquisadoras de sua equipe, o que infringe as regras internacionais. O grupo coordenado por Hwang foi o primeiro do mundo a obter linhagens de células-tronco humanas a partir da clonagem, em fevereiro de 2004.

Segundo o Ministério da Saúde da Coréia do Sul, não foi cometido nenhum crime moral ou legal, porque na época em que a doação foi realizada, o país ainda não havia adotado a lei da bioética, em vigor desde janeiro.

No entanto, vários países consideram esse tipo de conduta uma violação da ética médica, pois caracterizaria a coação de um subordinado para colaborar em uma experiência, já que há uma relação de dependência.

Hwang afirmou que as cientistas de sua equipe a princípio lhe ofereceram seus óvulos.

- Eu claramente rejeitei - afirmou.

Depois, sem o seu conhecimento e usando nomes falsos, as pesquisadoras teriam feito as doações em 2002 e 2003.

- A tecnologia não era tão avançada quanto é hoje, e criar uma linha de células-tronco exigia oócitos (óvulos) - explicou.

Segundo o sul-coreano, só soube da verdade no começo desse ano. Mas, a pedido das mulheres e para preservar sua privacidade, manteve o segredo. Afirmou que compreendia a atitude das colegas e que se fosse mulher, provavelmente, teria feito o mesmo.

- Lamento profundamente ter de evocar estes pontos vergonhosos e miseráveis. Peço sinceramente perdão pelo transtorno provocado à Coréia do Sul e ao mundo - afirmou Hwang Woo-Suk.

Após se declarar arrependido, o cientista anunciou seu afastamento da presidência do Centro Mundial de Célula-tronco (primeiro banco de células-tronco internacional, inaugurado no dia 19 de outubro, em Seul) e de todas as outras responsabilidades que tinha no governo do país. O especialista admitiu que a pressa em obter avanços científicos pode ter prejudicado o julgamento ético no desenvolvimento de sua pesquisa.

Em maio de 2004, quando a revista Nature pressionou Hwang sobre a origem dos óvulos, ele negou que eram das próprias pesquisadoras. Mas ontem reconheceu que mentiu ao veículo - uma das publicações mais respeitadas do meio científico.

O escândalo veio à tona no início do mês, quando o pesquisador americano Gerald Schatten, da Universidade de Pittsburgh, após trabalhar durante quase dois anos junto à equipe do cientista, rompeu a colaboração. Alegou em comunicado discordar da forma como o grupo obtinha óvulos humanos.

As revelações ocorrem na mesma semana que um médico que trabalhou com Hwang confessou ter pagado a 16 mulheres cerca de US$ 1.500 para cada uma em troca de seus óvulos. Mas segundo o pesquisador, o sul-coreano não tinha conhecimento da compra.

A Coréia do Sul vem se tornando líder nessa frente de pesquisas e Hwong era o principal pesquisador nessa linha, sendo considerado um herói nacional. Seu último feito foi esse ano, o primeiro clone de um cão do mundo. Snuppy, como foi chamado o animal, foi classificado pela revista americana Time como a ''invenção mais impressionante do ano''.

Mas Jin Kyo-hoon, uma especialista em Bioética da Universidade Nacional de Seul, alertou que a postura relutante das autoridades em aceitar problemas éticos nas pesquisas, pode prejudicar o status que o país vem alcançando nessa área.

O governo já se antecipou, por exemplo, emitindo selos comemorativos de futuras realizações de Hwang. A ilustração mostra um homem se levantando de uma cadeira de rodas e caminhando.

O estudo de células-tronco pode levar a cura de problemas como lesões na coluna e ajudar no tratamento de doenças, pois tem a propriedade de se diferenciar em qualquer tipo de tecido.