Valor Econômico, v. 20, n. 4972, 01/04/2020. Especial, p. A14

Cenário se dissolve e acelera revisões do PIB para baixo

Arícia Martins
Ana Conceição
Victor Rezende 


As perspectivas de redução maior do nível de atividade global e doméstico em razão do coronavírus seguem desencadeando revisões pessimistas para o desempenho do Produto Interno Bruto (PIB) no Brasil. Ontem, quatro instituições divulgaram seus novos números para 2020, que vão de recuo de 2,5% até retração de 1%.

Em sua primeira atualização de cenário desde o começo de março, quando ainda trabalhava com expansão de 2% da economia brasileira, o Bradesco passou a projetar queda de 1% do PIB na média anual. O banco espera contração de igual magnitude do PIB global.

“O país vinha exibindo uma recuperação econômica gradual e esperava- se aceleração do crescimento com a eventual aprovação de novas reformas econômicas, mas o processo foi interrompido”, diz o departamento econômico chefiado por Fernando Honorato, em relatório.

A nova estimativa considera que a duração do período de confinamento e as medidas econômicas para atenuar a crise vão evitar tombo maior do PIB no ano. Mesmo assim, as simulações do Bradesco indicam que a economia pode recuar 1% no primeiro trimestre ante os três meses anteriores, feitos os ajustes sazonais. No segundo trimestre, a queda poderia chegar a 4,5%.

Pela ótica da demanda, o consumo das famílias deve diminuir 1,2% em 2020, calcula o banco, enquanto a formação bruta de capital fixo (FBCF, medida das Contas Nacionais do que se investe em máquinas, construção civil e inovação) deve ficar 2% menor em relação a 2019.

Do lado da oferta, os economistas do Bradesco apontam que o setor mais atingido será o de serviços, cujo PIB deve encolher 1,2% no ano. Já a indústria deve ter contração de 0,8% e o setor agropecuário, alta de 1%. “Nesse cenário, a taxa de desemprego se elevará de 12,1% em 2019 para 13,3% em 2020”, estimam eles.

Também em revisão publicada ontem, o Banco Inter projeta que o PIB vai cair 1,7% em 2020 por causa do impacto da pandemia sobre a produção e o consumo. A estimativa anterior era de crescimento de 2,1%.

A instituição espera que o efeito mais significativo ocorra no segundo trimestre, período em que a produção industrial deve recuar 15% sobre o mesmo período de 2019, com redução de 20% no varejo e nos serviços. De abril a junho, o PIB deve encolher 9% na mesma comparação.

“Baseamos nossas estimativas no impacto observado na economia chinesa entre janeiro e fevereiro. Essa queda pode ser maior caso a quarentena, principalmente o fechamento do comércio, se prolongue além do mês de maio”, diz a economista-chefe Rafaela Vitória, em relatório.

Para Dev Ashish, economista para América Latina do Société Générale, o mais provável é que a economia brasileira enfrente todo o impacto do vírus em março e no segundo trimestre de 2020. Os efeitos negativos, no entanto, podem se estender pelo terceiro trimestre, período de inverno no país, alerta Ashish em relatório, no qual estima contração de 2% do PIB brasileiro no ano.

Em bases anualizadas, o banco francês projeta redução de 4,9% e 11% do PIB no primeiro e segundo trimestres, respectivamente, com volta ao campo positivo já no terceiro trimestre (alta de 2,1%).

Na ponta mais pessimista, Cristiano Oliveira, economista-chefe do banco Fibra, estima que apenas o último trimestre de 2020 deve registrar crescimento, de 2,5% sobre o terceiro na comparação com ajuste sazonal. Na média anual, Oliveira espera queda de 2,5% do PIB, projeção que era de alta de 0,8% antes.

A atualização levou em conta recuo mais expressivo do PIB global do que o previsto anteriormente, assim como efeito maior das necessárias medidas de distanciamento social no Brasil sobre a economia doméstica, explica o economista-chefe do Fibra.

“Mesmo levando em conta o efeito positivo de parte das medidas [do governo para mitigar os impactos da crise], estamos revisando para baixo novamente a estimativa de crescimento para o PIB em 2020”, aponta Oliveira.

Segundo ele, o PIB do setor de serviços deve recuar 2,1% neste ano, enquanto o industrial deve cair 2,6%. Já o setor agropecuário deve crescer 3% por causa da safra recorde no país. Com a retração da atividade, a taxa de desemprego média em 2020 deve aumentar para 13,3%, ante 11,9% no ano passado, prevê.