Valor Econômico, v. 20, n. 4972, 01/04/2020. Finanças, p. C2
Rápida ação de BCs ajuda a limitar volatilidade no câmbio
Marcelo Osakabe
A rápida ação dos grandes bancos centrais para lidar com os problemas de liquidez causados pela crise da covid-19 ajudou a diminuir a volatilidade do câmbio, que tem ficado bem abaixo dos picos de 2008. No Brasil, o movimento foi favorecido pelo fato de o mercado estar reduzindo o uso de derivativos cambiais, depois de problemas observados no segmento durante a crise anterior.
Um dos principais indicadores de risco cambial, a volatilidade implícita do dólar - medida a partir das operações com opções cambiais e que indica o tamanho da incerteza em relação à cotação futura - no Brasil chegou a tocar 23,89% na semana do dia 20, até o momento o pico da atual crise. O valor é metade da máxima registrada em 2008, quando este indicador chegou a 49,08% no Brasil. Ontem marcava 19,5%. O valor é metade da máxima registrada em 2008, quando este indicador chegou a 49,08% no Brasil. Ontem marcava 19,5%.
“Esta crise que estamos vivendo talvez tenha sido, até agora, menos grave para os mercados e para as moedas porque, naquele momento, ela começou diretamente no setor financeiro e questionou a capacidade de sobrevivência do sistema como um todo”, diz o sócio e gestor para moedas, juros globais e commodities da Novus Capital, Ricardo Kazan. Dessa vez, continua, os BCs aprenderam que precisam atuar rápido.
“As taxas de juros não começaram a cair de 0,25 em 0,25 ponto, elas foram rapidamente derrubadas a zero e programas de relaxamento quantitativo (QE) foram rapidamente montados não apenas pelos três maiores BCs, mas em outros países desenvolvidos e emergentes, até no Brasil. Essa atuação forte e rápida levou a uma freada na piora das condições. Talvez se a resposta tivesse demorado muito, poderíamos ter visto o nível de volatilidade continuar subindo.”
Entre as ações anunciadas nas últimas semanas, o Federal Reserve voltou a oferecer linhas de swap de moedas. A decisão ocorreu após o mercado monetário internacional emitir sinais de escassez da moeda americana. Por sua condição singular na economia global, houve momentos em que se desenhou uma corrida das empresas e instituições para ter liquidez em dólar, inclusive se desfazendo de outros ativos considerados seguros, como o ouro e os Treasuries.
A rápida reação do Fed e de outros BCs teve efeito visível. De acordo com o Société Générale, enquanto a volatilidade implícita do par euro/dólar, o mais negociado no mundo, atingiu a máxima desde 2016, todos os outros ativos ficaram tão ou mais voláteis que em 2008. No último dia 16, inclusive, o índice de volatilidade VIX, conhecido como o “termômetro medo de Wall Street”, superou a máxima de 2008, ao tocar 82,69 pontos.
No Brasil, a lembrança das quebras e fusões de empresas nacionais naquele período foi outro fator que ajudou a reduzir a incerteza sobre o câmbio, diz Daniel Tatsumi, o gestor de moedas da ACE Capital. “Em 2008, estava muito na moda operar com produtos estruturados, que davam ao exportador uma opção de funding mais barata. Como o dólar saiu do controle, muitas empresas e até bancos tiveram problemas de margem e deixaram de usá-los”, afirma.
Desde então, os produtos que foram criados tiveram inclusive a preocupação de evitar problemas do tipo. Essa mudança levou a uma posição técnica bastante diversa daquela existente em 2008. Hoje, diz o profissional, o mercado de opções em moeda tem poucos “players” e é bastante ilíquido. Se, por um lado, isso significa menos negócios, por outro, não houve necessidade de vender a qualquer preço. “O que leva os preços a chegar a níveis absurdos é o ‘stop-loss’. Foi o que vimos, por exemplo, no mercado de juros há algumas semanas.”
O histórico da volatilidade implícita mostra que o atual pico é menor que o registrado durante a eleição presidencial de 2018, quando chegou a 31,81%. Para Tatsumi, no entanto, é preciso olhar para outras medidas de volatilidade, como a “buterfly”, que mostra a dispersão da volatilidade entre opções de venda e de compra. “É natural que eleições sejam eventos de grande volatilidade, mas elas são um evento de escolha binária com data para acabar. Não é o que temos agora. Se o dólar sair de R$ 5,00 para R$ 4,00 ou R$ 6,00 não quer dizer que a crise está resolvida”, diz.
Ontem, o dólar encerrou as operações cotado a R$ 5,1960, com alta de 0,31% no dia e 15,96% acumulada no mês. Esta é a maior alta desde setembro de 2011. No segmento de juros da B3, o contrato de Depósito Interfinanceiro (DI) para janeiro de 2021 caiu de 3,39% no ajuste anterior para a 3,215% no final da sessão regular.