Valor Econômico, v. 20, n. 4972, 01/04/2020. Finanças, p. C5

MP antecipa proteção legal a diretores para atuação na crise
Alex Ribeiro


A Medida Provisória (MP) nº 931 antecipa temporariamente para o atual período de crise do coronavírus a proteção legal que os diretores do Banco Central pretendem alcançar com a lei de independência da instituição, que tramita no Congresso.

A diretoria colegiada terá que tomar, nas próximas semanas, decisões difíceis sobre compras de ativos no mercado e sobre a concessão de linhas de assistência de liquidez com lastro em um conjunto mais amplo de ativos, como letras financeiras (LF) lastreadas em carteiras de crédito.

São medidas urgentes que podem ser vitais para determinar o bom funcionamento do mercado financeiro e da própria economia. A última coisa que o dirigente do BC deve se preocupar é se vai colocar em risco o seu patrimônio pessoal em eventuais ações civis de reparação de danos.

O projeto de lei que concede independência ao BC já procura estabelecer essa proteção legal de forma permanente, algo que tem sido cobrado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI) nas suas avaliações sobre a estabilidade financeira do país.

A exposição de motivos da MP, divulgada ontem pelo BC, lembra que ex-dirigentes que adotaram medidas em períodos de estresse estão respondendo a processos na Justiça. Os processos incluem dirigentes do BC que criaram o Proer na crise bancária do Plano Real; que socorreram os bancos Marka e FonteCidam na desvalorização de 1999; e que obrigaram a marcação de mercado de fundos na crise de 2002.

A proteção legal, porém, é restrita. Só vale para processos cíveis, e não criminais. Para fazer jus à proteção, o dirigente e funcionários do BC têm que ter agido de boa-fé, ou seja, não podem ter cometido dolo ou fraude.

Isso significa que os dirigentes do BC não estariam protegidos no caso de improbidade administrativa. Levantamento feito pelo V passado apontou 25 processos contra ex-dirigentes do BC, dos quais dez ações de improbidade administrativa. Os nove ex-presidentes do BC desde o Plano Real respondem por improbidade administrativa, com exceção dos três últimos, Ilan Goldfajn, Alexandre Tombini e Henrique Meirelles.

A busca, de última hora, de um mecanismo de proteção para os dirigentes do Banco Central é mais uma evidência da falta que uma lei de BC independente faz em momentos de crise como o atual. O Banco Central busca, por meio de uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC), a ampliação de seus poderes de atuação, igualando-os aos seus pares no exterior, que têm lançado mão de vários instrumentos não convencionais para estabilizar o mercado. O BC quer poder comprar títulos públicos e privados.

Há, porém, uma reação no Congresso Nacional a dar tantos instrumentos ao BC, com o argumento de que a instituição não é independente - e que esses poderes poderiam ser mal-usados se um governo inflacionista resolver interferir nos assuntos da autoridade monetária.