O Globo, n. 32560, 29/09/2022. Política, p. 7

TSE manda investigar dirigentes do PL após texto com ataque a urnas

Mariana Muniz
Eduardo Gonçalves
Bruno Abbud
André de Souza


Em dura reação, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) determinou ontem a apuração de responsabilidade criminal de integrantes do PL, partido do    presidente Jair Bolsonaro, após a sigla divulgar um documento em que questiona, sem apresentar qualquer prova, a segurança das urnas eletrônicas. Em nota, a Corte qualificou as afirmações como “falsas e mentirosas” e “clara tentativa de embaraçar e tumultuar o curso natural do processo eleitoral”.

O partido produziu um relatório de duas páginas, com o título de “Resultados da Auditoria de Conformidade do PL”, em que afirma haver um “quadro de atraso” no TSE em relação a “medidas de segurança da informação”, o que geraria “vulnerabilidades relevantes”. O documento foi preparado no momento em que Bolsonaro elevou o tom das críticas ao TSE e tem indicado que, caso não vença, deve contestar o resultado. O texto não tem assinatura, mas tem o timbre do PL e foi divulgado pelo vice-presidente da sigla, Capitão Augusto.

“As conclusões do documento intitulado ‘resultados da auditoria de conformidade do PL no TSE’ são falsas e mentirosas, sem nenhum amparo na realidade, reunindo informações fraudulentas e atentatórias ao Estado Democrático de Direito e ao Poder Judiciário, em especial à Justiça Eleitoral, em clara tentativa de embaraçar e tumultuar o curso natural do processo eleitoral”, rebateu o TSE.

O presidente da Corte, Alexandre de Moraes ainda determinou a imediata remessa do documento do PL ao inquérito no STF que apura a divulgação de informações falsas, o chamado “inquérito das fake news”.

Horas antes da divulgação do documento, o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, esteve no TSE reunido com Moraes. Após visitar a sala onde é feita a totalização de votos das eleições — chamada de “sala secreta” por Bolsonaro —, o cacique do partido do presidente admitiu que não há nada secreto no local:

— Não tem mais. Agora é aberta — afirmou.

A interlocutores, Valdemar já afirmou que o partido não encampa o discurso de teor golpista de Bolsonaro sobre as urnas eletrônica seque a sigla aceitará o resultado das eleições seja ele qual for.

O documento do PL sobre as urnas foi produzido pela equipe do Instituto Voto Legal (IVL) comandada pelo engenheiro Carlos Rocha, que foi contratado pelo partido para fiscalizar a votação. Em junho, o partido desistiu de credenciar o instituto para fiscalizar o processo eleitoral.

Ao GLOBO, Carlos Rocha disse que o objetivo da auditoria é “colaborar de forma construtiva com a Justiça Eleitoral”.

Sala clara e aberta

Além de Valdemar, Moraes também recebeu ontem o ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, e outros representantes de partidos para visitar a sala.

O local fica no terceiro andar do TSE e é separada por divisórias de vidro de outra sala contígua a ela. Os servidores que trabalham lá não fazem contagem manual de votos. O sistema do tribunal recebe os boletins de urna, que contém os votos de cada equipamento, e faz a totalização sem participação humana. Técnicos do TSE acompanham para verificar se tudo está sendo executado da forma adequada e para evitar problemas, como falhas ou sobrecarga na rede.

Em entrevista à imprensa após a visita, o presidente do TSE, o ministro Alexandre de Moraes, também refutou a alcunha de “sala secreta”.

— Nós realizamos hoje (ontem) uma visitação à sala de totalização exatamente para mostrar o que já é óbvio, mas sempre é importante atuar com transparência, com lealdade a todos aqueles que participam do processo eleitoral para demonstrar que é, como vocês puderam ver, uma sala aberta,é uma sala clara. Não é nem sala secreta, nem sala escura — disse Moraes.

As eleições deste ano contarão com 160 observadores de diferentes entidades internacionais, número recorde desde que a Organização dos Estados Americanos passou a enviar representantes para acompanhar as votações no país, em 2018, ano em que a delegação tinha apenas 50 pessoas. Ao fim do pleito, o grupo elabora relatórios com análises e sugestões de aperfeiçoamento do sistema eleitoral.