Valor Econômico, v. 20, n. 4973, 02/04/2020. Empresas, p. B1

Tomógrafo desenvolvido no Brasil custa um décimo do convencional

Rodrigo Carro


Um projeto iniciado há 15 anos no Brasil promete aprimorar o uso de um equipamento crucial no tratamento da covid-19: os respiradores artificiais. Trata-se de um tomógrafo portátil que custa pelo um décimo de um aparelho convencional e permite aos médicos acompanharem o fluxo de ar nos pulmões do paciente em tempo real.

Produzido pela startup brasileira Timpel, o tomógrafo tem mais de 150 unidades em operação, inclusive no tratamento de pacientes com o novo coronavírus na Espanha, na Itália e nos Estados Unidos.

Ao contrário dos tomógrafos convencionais, que utilizam raios X para gerar imagens em alta definição, o aparelho da Timpel - desenvolvido com recursos da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) - usa impulsos elétricos para analisar o funcionamento dos pulmões.

“Queremos tirar o paciente do ventilador no momento certo”, diz o engenheiro Rafael Holzhacker, presidente da Timpel. “Retirar antes aumenta o risco do paciente ser reentubado. Retirar depois, ocupa o leito e sujeita o paciente a efeitos colaterais.”

Apesar de ser vital para a sobrevivência do paciente no curto prazo, a ventilação artificial pode provocar estresse mecânico nos pulmões, levando à morte do doente. Um software integrado ao tomógrafo, desenvolvido a partir de um projeto apoiado pela Fapesp, permite à equipe médica avaliar a melhor estratégia de ventilação para proteger o paciente.

O aparelho gera 50 imagens por segundo, ainda que com uma resolução menor que a de um equipamento convencional. No tomógrafo brasileiro, uma cinta com 32 eletrodos faz circular uma corrente elétrica de baixa intensidade ao redor do tórax do paciente.

Com o pulmão cheio de ar, aumenta a resistência à passagem da corrente elétrica, uma vez que a mistura gasosa é péssima condutora de eletricidade. Já com os pulmões vazios, no caso da expiração, a resistência à passagem da corrente diminui. Essas variações são traduzidas em imagens.

Portátil, com cerca de 40 quilos, o aparelho desenvolvido no Brasil pode ser colocado ao lado do leito do paciente, o que reduz a necessidade de transportar a pessoa até o setor de radiologia, onde normalmente estão instalados os tomógrafos convencionais. Isso diminui a possibilidade de contaminação. “[É] uma operação muito arriscada para pacientes com covid-19, que precisam ser mantidos em isolamento”, ressalta Holzhacker.

A Timpel iniciou a produção do tomógrafo em 2015, quando ficou pronta a primeira versão comercial do aparelho. O caminho até a fabricação do produto, no entanto, foi longo. Começou em 2005, a partir das discussões entre um grupo de pneumologistas que precisavam de uma ferramenta que permitisse implementar nos hospitais a chamada “ventilação protetiva”, que previne os efeitos colaterais do respirador.

Em 2016, a startup paulista iniciou as exportações para a Europa e, no ano passado, entrou no mercado americano. No Brasil, o aparelho tem unidades em funcionamento em hospitais de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Pará e Paraná.

A empresa pretende utilizar os dados da aplicação do equipamento no tratamento de pacientes graves com covid-19 na Itália e Espanha para desenvolver e validar um algoritmo computacional específico para definição de estratégias de ventilação em casos da doença.