Valor Econômico, v. 20, n. 4973, 02/04/2020. Internacional, p. A11

Acusada de omitir casos, China tem nova quarentena 



A província de Henan, no centro da China, voltou a impor quarentena obrigatória a parte população, na tentativa de conter uma segunda onda do coronavírus. As restrições foram decretadas justo quando documento vazado nos EUA acusa a China de mentir em relação ao número real de casos e de mortes no país.

Ontem autoridades locais de Henan proibiram entrada e saída do distrito de Jia, próximo à cidade de Pingdingshan, de 600 mil habitantes. O varejo não essencial foi fechado e moradores foram proibidos de deixar suas casas, segundo o jornal “‘South China Morning Post”, publicado em Hong Kong.

A adoção de uma nova quarentena levanta a possibilidade de que as medidas de isolamento social adotadas pela maioria dos países no combate à epidemia poderão não ter um final claro, mas ir e vir, de acordo com a oscilação do número de casos.

Os moradores do distrito precisam de permissão do governo local para sair à rua e, quando o fazem, têm de usar máscara.

No domingo, três novos casos foram registrados oficialmente em Jia. No sábado, um médico que trabalha no hospital local teve teste positivo para o coronavírus.

Henan, que fica ao norte de Hubei, onde a epidemia começou em novembro, teve 1.276 casos e 22 mortes, segundo dados oficiais chineses compilados pela Universidade Johns Hopkins, nos EUA.

A volta da quarentena ocorre no momento em que a China tenta impedir uma segunda onda de coronavírus, em meio a esforços para retomar a atividade econômica.

Após quase dois meses de restrições para conter a disseminação do coronavírus, a China teve um declínio no número de casos nas últimas semanas. Na sexta-feira, porém, o governo disse que havia cerca de 600 novos casos “importados” e proibiu a entrada de estrangeiros. Ontem a Comissão Nacional de Saúde da China registrou 36 novos casos, sendo 35 importados.

O número oficial de casos na China, no entanto, está sendo contestado pelos EUA. Relatório elaborado pela inteligência americana, que vazou ontem, concluiu que a China ocultou a extensão da epidemia no país, subnotificando o total de casos e de mortes.

À agência Bloomberg, três autoridades americanas disseram que a principal conclusão do documento é que os dados do governo chinês são falsos e que a China divulgou informações erradas de modo intencional. O relatório chegou à Casa Branca na semana passada, disseram autoridades.

A Casa Branca e a embaixada chinesa nos EUA não comentaram o episódio. Até a noite de ontem, não havia reação oficial da China.

“O que parece evidente agora é que muito antes de o mundo descobrir em dezembro que a China estava lidando com isso, talvez até um mês antes disso, a epidemia já existia no país”, disse o vice-presidente dos EUA, Mike Pence, à CNN.

A nova quarentena na província de Henan levanta mais suspeitas, já que parece haver poucos casos para justificar a medida.

Primeiro centro da pandemia, a China teve até ontem cerca de 82.400 casos da doença e 3.316 mortes, segundo dados oficiais compilados pela Johns Hopkins.

Desde o início da crise, a China revisou várias vezes a metodologia usada para contabilizar a quantidade de pessoas infectadas, o que levantou dúvidas sobre a confiabilidade da informação divulgada.

Ontem, o país passou a incluir casos assintomáticos na contagem. Somente na terça-feira, 1.500 pessoas que tiveram teste positivo para o coronavírus, mas não tinham sintomas da doença, foram incluídas no balanço da Comissão Nacional de Saúde chinesa.