Valor Econômico, v. 20, n. 4974, 03/04/2020. Brasil, p. A4

Investimento público cresce no 1º tri com reação à pandemia

Lu Aiko Otta 


A reação do governo à pandemia do coronavírus já modificou o perfil dos investimentos federais, aponta levantamento da organização não governamental Contas Abertas entregue ao Valor. De janeiro a março deste ano, chegaram a R$ 5,830 bilhões, com crescimento de 15%, em comparação com igual período do ano passado. Em termos nominais, foi um aumento de R$ 764 milhões, concentrado nos ministérios da Saúde, da Educação e da Justiça.

“Foi uma surpresa”, admitiu o secretário-geral da organização, Gil Castello Branco. Ele imaginava que, diante dos reflexos econômicos da crise, haveria uma forte retração. Mas os números mostram o movimento contrário. “Aumentou principalmente pelo lado da saúde, em detrimento de outras áreas.”

Os investimentos do Ministério da Saúde aumentaram 85,5% no trimestre, atingindo R$ 844,8 milhões. A alta ficou concentrada em “estruturação de unidades de atenção especializada em saúde”, com R$ 540 milhões. Nessa ação se enquadram os repasses a Estados e municípios específicos para investimentos, como aparelhamento e ampliação de unidades de atendimentos de média e alta complexidades.

É um valor ainda inferior a pastas que tradicionalmente concentram investimentos, como a da Infraestrutura, que investiu R$ 1,316 bilhão, um avanço de 0,95%. No período, a ação que mais avançou naquela pasta foi “conservação e recuperação de ativos de infraestrutura da União”, com R$ 134 milhões.

Os dados isolados do mês de março, quando a pandemia começou a se agravar no Brasil, mostram que os investimentos na área de saúde se aceleraram ainda mais. Chegaram a R$ 435 milhões, aumento de 102% sobre março de 2019. Ao mesmo tempo, o Ministério da Infraestrutura amargou uma queda de 17% nos desembolsos, atingindo R$ 499 milhões.

De janeiro a março, os investimentos da Saúde praticamente empataram com os do Ministério da Defesa, que no ano passado liderou os gastos do governo federal nesse grupo de despesas. “Acho que mandar dinheiro para a Engeprom no apagar das luzes do ano, como ocorreu em 2019, o governo vai ter de evitar”, comentou Castello Branco. “A guerra agora é outra.”

Em dezembro de 2019, o governo injetou R$ 7,6 bilhões na Engeprom, empresa estatal ligada à Marinha, para a construção de corvetas. Na época, o secretário do Tesouro, Mansueto Almeida, explicou que a ideia original era transferir o dinheiro de forma parcelada, em três ou quatro anos. Mas, como havia espaço fiscal, a operação foi feita de uma só vez.

Um outro dado aponta para uma tendência de crescimento ainda mais forte dos investimentos em 2020: o volume de empenhos emitidos. No primeiro trimestre de 2020, o volume empenhado para investimento atingiu R$ 4,1 bilhões, 36% a mais do que em 2019.

O empenho é a primeira etapa de um gasto público e corresponde ao comprometimento de um recurso para pagar uma despesa específica. O desembolso ocorrerá mais à frente, com a entrega da obra ou serviço.

Castello Branco explica que os dados de investimentos coletados pelas Contas Abertas não coincidem com os do Tesouro Nacional porque a contabilização das ordens bancárias ocorre em momentos diferentes. Há diferença também no tratamento de despesas financeiras.