Valor Econômico, v. 20, n. 4974, 03/04/2020. Brasil, p. A4

Estados investiram valor mais baixo desde 1947 no pré-crise

Hugo Passarelli 


O investimento público voltou a cair em 2019, puxado pela retração dos aportes das estatais e dos Estados, que tiveram o pior desempenho desde 1947, mostra levantamento do economista Manoel Pires, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação

Getulio Vargas (Ibre/FGV). O dado consolidado com todos os entes e empresas públicas federais ficou em 2,26% do Produto Interno Bruto (PIB) no ano passado, abaixo dos 2,7% em 2018, e acima apenas do que em 2017, quando atingiu 1,85%.

A diminuição do peso do governo nos investimentos ganha força a partir de 2015, em meio às tentativas de controlar 

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Getulio Vargas (Ibre/FGV). O dado consolidado com todos os entes e empresas públicas federais ficou em 2,26% do Produto Interno Bruto (PIB) no ano passado, abaixo dos 2,7% em 2018, e acima apenas do que em 2017, quando atingiu 1,85%.

A diminuição do peso do governo nos investimentos ganha força a partir de 2015, em meio às tentativas de controlar  o déficit público. A crise de saúde com o novo coronavírus, porém, pode mudar esse cenário, opina Pires.

“A tendência é que as pessoas passem a valorizar o governo como garantidor do bem-estar”, diz. Segundo ele, o novo equilíbrio não levaria a um inchaço da máquina pública e, sim, à percepção de que em setores como educação e saúde o capital privado não substitui o Estado.

A gestão das contas públicas adotada desde o governo de Michel Temer e aprofundada por Jair Bolsonaro representa “o pior de dois mundos”, avalia. “Os recursos para a ciência e educação estão minguando. Ao mesmo tempo, não avançamos no controle de despesas correntes ou racionalização dos tributos”, diz.

O desfecho dessa combinação é o subfinanciamento de atividades essenciais. “Os investimentos brasileiros são muito baixos mesmo quando olhamos para países que passaram por redução da atividade estatal”, afirma.

O economista argumenta que, com aumento da demanda por leitos e outros serviços médicos por causa da disseminação da covid-19, o Sistema Único de Saúde (SUS) pode conseguir abocanhar mais recursos.

“O SUS sempre sofreu porque nunca teve uma base de financiamento estável, mas depois da crise é difícil não justificar a sua existência”, opina.

Em grave crise fiscal, o conjunto dos Estados investiu no ano passado o equivalente a 0,40% do PIB, de 0,53% no ano anterior, o pior desempenho já registrado. A cifra vinha de uma base deprimida e, após o ano eleitoral, caiu ainda mais, explica Pires.

A paradeira da economia neste ano também vai afetar a arrecadação de impostos, contribuindo para perda de fôlego extra nas contas estaduais. Para completar o cenário, a necessidade de se aplicar mais recursos para a saúde não necessariamente significa que mais hospitais serão construídos, por exemplo.

“Mesmo sendo um investimento super urgente, o que vai se fazer é muito mais realocação de gasto público para compra de máscaras e respiradores, por exemplo, do que para construção de novos hospitais. Logo, não é o investimento clássico de infraestrutura de longo prazo”, explica. Tudo somado, o investimento dos Estados deve ter outra queda quando forem conhecidos os números de 2020, estima.

O dado consolidado em 2019 também foi penalizado pelas estatais, sobretudo a Eletrobras e a Petrobras, que encolheram seus aportes e puxaram a queda do investimento estatal de 1,24% para 0,80% do PIB. Na ponta oposta, municípios e União mostraram leve avanço entre 2018 e 2019.

O levantamento aponta que, no ano passado, o setor público representou 14,73% do total da Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF, medida do que se investe em máquinas, equipamentos, construção civil e inovação). Trata-se de um recuo ante 2018, quando foi o equivalente a 17,74% da FBCF, mas uma recuperação ante 2017, quando minguou a 12,69%. Ainda assim, está distante de 2010, quando o setor público contribuiu com 22,20% do investimento total.