Valor Econômico, v. 20, n. 4974, 03/04/2020. Brasil, p. A4

Arrecadação de fevereiro mostrava queda mesmo antes dos efeitos da crise

Mariana Ribeiro
Edna Simão


A arrecadação de impostos federais recuou em fevereiro, mesmo sem captar os efeitos da pandemia do coronavírus, o que começará a acontecer em março. Em fevereiro, o recolhimento de tributos teve queda real de 2,71% ante o mesmo mês de 2019, somando R$ 116,430 bilhões, segundo dados da Receita Federal.

Mesmo com o desempenho mensal, o recolhimento totalizou R$ 291,421 bilhões no bimestre, elevação real de 1,61% ante o mesmo período de 2019 e o maior valor da série para o período.

O resultado apurado em fevereiro causou certa estranheza em relação à tendência para a arrecadação. Dias antes, o ministro da Economia, Paulo

Guedes, havia dito ter recebido relatos do secretário da Receita, José Barroso Tostes Neto, de que, nos primeiros 15 dias de março, a arrecadação estava crescendo 20% acima do previsto. Segundo ele, os dados mostravam que a economia estava “decolando” antes da crise.

Questionado sobre a fala do ministro, o chefe do Centro de Estudos Tributários e Aduaneiros, Claudemir Malaquias, evitou embates e disse que o desempenho em fevereiro foi “extremamente positivo”. Ele destacou que o resultado do mês é o segundo melhor da série para o período, ficando atrás apenas do obtido no ano passado - o que também havia sido pontuado por Guedes em sua fala. Além disso, Malaquias destacou que, em fevereiro de 2019, o fisco contabilizou uma receita atípica de R$ 4,6 bilhões, o que não se repetiu neste ano.

O técnico da Receita acrescentou que, em março, a arrecadação será “parcialmente afetada” pela pandemia. Isso porque os efeitos sobre a atividade econômica foram verificados mais para o fim do mês. Para ele, o impacto será diferenciado entre os setores e alguns poderão ter números até maiores do que os apurados em 2019.

Malaquias não apresentou estimativas para o ano. Ressaltou que os números de março estão sendo fechados e então terá condições de informar os efeitos da pandemia na arrecadação. “A classificação das receitas deve estar pronta na próxima semana e, tão logo tenhamos os números, teremos condições de divulgar com precisão”, disse. Com o agravamento da pandemia, a tendência é de queda das receitas nos próximos meses.

O resultado de fevereiro, que deveria ter sido divulgado até o fim de março, foi anunciado com atraso pela Receita. Segundo Malaquias, isso aconteceu porque a equipe técnica estava com um “acúmulo de tarefas” devido ao grande fluxo de demandas.

O desempenho de fevereiro foi fortemente influenciado pelo menor recolhimento de impostos pelas empresas. As receitas com Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL) somaram R$ 16,272 bilhões, queda real de 26,72% sobre o mesmo período do ano anterior. Em fevereiro de 2019, houve entrada de receita atípica com IRPJ/CSLL no valor de R$ 4,6 bilhões.

No período, dez setores econômicos apresentaram forte redução da arrecadação de IRPJ/CSLL, com queda real de 58,44% sobre o mesmo mês do ano passado. O menor recolhimento entre as entidades financeiras chegou a 72,66%; no setor de fabricação de celulose e produção de papel, a baixa foi 77,77%; no de metalurgia, de 63,29%, e na fabricação de veículos automotores, de 50,25%.