Correio Braziliense, n. 21846, 08/01/2023. Brasil, p. 6 
 
Esperança e otimismo na sociedade civil 

Ândrea Malcher 
 
 
Os compromissos com grupos minoritários assumidos durante a posse de Silvio Almeida no Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania foram recebidos com otimismo por membros da sociedade civil e ativistas, mas o diagnóstico é unânime: o trabalho não será fácil. Com o mote de reconstrução, representatividade e transversalidade no trabalho com outras pastas do novo governo, Direitos Humanos e Cidadania enfrenta hoje diversos retrocessos herdados dos últimos quatro anos de Damares Alves como ministra. 

No caso das pessoas com deficiência, o exemplo, o Instituto Olga Kos divulgou o relatório do Índice de Inclusão para Pessoas com Deficiência apontando que menos de 20% de crianças PCD se encontram matriculadas no ensino regular. A desigualdade é tamanha que, no ensino superior e técnico, a marca não chega a 1%. No levantamento foi apurado, ainda, que 70% desconhecem a legislação voltada para pessoas com deficiência.   

Para Danilo Braz, vice-presidente da Comissão de Direitos da Pessoa com Deficiência da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal (OAB/DF), rever políticas descontinuadas é a primeira etapa de trabalho a ser feito neste novo governo, “para só assim começar a traçar novas estratégias que possibilitem uma vida mais digna a todos aqueles que têm algum tipo de deficiência”.   

“A demanda ‘carro-chefe’ para colocar em prática na nova gestão seria a instituição de políticas públicas voltadas à integração e reintegração da pessoa com deficiência no mercado de trabalho de maneira eficaz”, argumenta Braz. “Porque, apesar de termos legislações que tratam do tema, ainda existe muito tabu na contratação de PCDs, principalmente no que diz a respeito da mão de obra especializada e ocupação de cargos superiores.” 

Outro grupo afetado pelos desmontes é o das crianças e adolescentes. Em 2020, por exemplo, Damares Alves declarou que uma resolução do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) que permite visita íntima a menores em unidades socioeducativas era uma medida de “financiamento de motel com dinheiro público”.   

Renato Godoy, gerente de relações governamentais do Instituto Alana, que advoga pelos direitos de crianças e adolescentes, destaca os ataques ao Conanda como um dos retrocessos a serem resolvidos. “Houve inúmeros retrocessos durante a gestão de Damares Alves e do ex-presidente Jair Bolsonaro”, afirma. “Eu destacaria em primeiro lugar o ataque à participação social nas construções de políticas públicas para crianças e adolescentes. Esse ataque se deu, sobretudo, visando diminuir o papel do Conanda.” 

Orçamento 

Outro ponto destacado pelo instituto, que foi consultado pelo governo de transição na formulação do diagnóstico apresentado em dezembro passado, foi a perda orçamentária de políticas públicas voltadas à crianças e adolescentes. “Vimos que há um processo muito grande de deterioração orçamentária que implicou, inclusive, a paralisia, e quase descontinuidade, de alguns programas, como por exemplo o Disque 100, que atende denúncias relacionadas à violência contra crianças e adolescentes”, observa. 

Ainda sobre os temas que envolvem a juventude brasileira, Godoy ressalta a satisfação com a menção aos órfãos da covid-19 no discurso de Silvio Almeida. “Entendemos que há um grande número de crianças e adolescentes que ficaram órfãos, inclusive há uma necessidade muito grande de elaboração de pesquisas e indicadores  para entender a magnitude desse público e, ao mesmo tempo, buscar uma forma de amparar essas crianças e adolescentes que, além de perderem afetivamente o pai e a mãe,  perdem completamente as condições materiais de sobrevivência”, argumenta o gestor. 

Godoy acredita que, com a promessa de cooperação entre ministérios garantida pelo ministro ao assumir o cargo, a fome e a desnutrição infantil serão tratadas de forma séria. “Entendemos que há algumas políticas em curso, com bons sinais de que isso deve de fato ser combatido pelo novo governo, como o novo Bolsa Família com R$ 150 por criança.”