Valor Econômico, v. 20, n. 4974, 03/04/2020. Especial, p. A16
Avaliação do governo cai com pandemia
César Felício
Sergio Lamucci
A avaliação popular do governo do presidente Jair Bolsonaro entrou em uma trajetória de declínio contínuo desde o início de março, com a eclosão da pandemia do coronavírus. Segundo pesquisa semanal com 1.581 entrevistas do instituto de pesquisa Ideia Big Data, com margem de erro de quatro pontos percentuais, Bolsonaro tinha 39% de avaliação boa ou ótima para o seu governo no levantamento dos dias 4 e 5 de março. Desde então, houve um recuo de sete pontos percentuais nessa soma, até chegar ao nível de 32% registrados na pesquisa encerrada em 1º de abril.
A curva de ruim e péssimo seguiu a trajetória oposta: partiu de 26% no início do mês passado para chegar a 37%. Houve, portanto, um cruzamento das linhas, e agora o sentimento majoritário da população em relação ao governo é desfavorável.
O mesmo movimento é registrado em relação à aprovação ou desaprovação do administração federal, ainda que neste item não tenha ocorrido um cruzamento de linhas: desde muitos meses a desaprovação ao governo é maior que a aprovação. Mas a diferença, que havia se estreitado a 4 pontos em dezembro, agora é de 16 pontos percentuais: 42% de desaprovação e 26% de aprovação.
O responsável pela pesquisa, o economista Maurício Moura, presidente do Ideia Big Data, avalia que, mesmo com essa trajetória recente, Bolsonaro ainda mantém uma base sólida de aprovação. O recuo das últimas semanas é diferente do ocorrido no primeiros meses de 2019 - o percentual de ótimo e bom caiu de 51% no começo de fevereiro para 28% no início de abril do ano passado.
Desde então oscilou bastante, com uma tendência de recuperação que culminou entre dezembro e janeiro, marcado por iniciativas como a concessão da 13ª parcela para o Bolsa Família, saques autorizados no
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), uma ligeira melhora na economia e uma certa calmaria no temperamento irascível do presidente.
“No primeiro trimestre de 2019 ele perdeu muito, cerca 20 pontos de aprovação em um período curto. Depois houve muita oscilação. Agora, se vê uma tendência de queda que não se via desde aquela época, mas não há a mesma intensidade de corrosão dessa base de apoio muito forte que ele tem”, diz Moura, também pesquisador da Universidade George Washington, sediada na capital americana.
Para ele, a razão é que Bolsonaro já perdeu a capa de eleitores que migraram para a sua candidatura por questões utilitárias, entendendo-o como um escudo contra o petismo, que segue sendo mais rejeitado que o bolsonarismo no eleitorado.
“Esse era um grupo de aprovação mais frágil, porque era basicamente em oposição ao anterior. Agora a gente entra numa perda de aprovação num território menos frágil dele, justamente por causa disso a perda de aprovação não deve ser numa velocidade tão grande”.
Segundo Moura, Bolsonaro perdeu mais no segmento da classe C, na faixa etária entre 30 e 40 anos, entre mulheres. Ele segue sólido entre homens, nas faixas etárias e de renda mais alta, e nos grandes centros urbanos.
A pandemia encontra Bolsonaro em um momento em que o presidente vai contra a corrente da maioria da opinião pública. Ainda que tenha diminuído em uma semana, o isolamento social da maneira como está sendo praticado hoje - ao qual o presidente se opõe - tem o apoio de 76% dos pesquisados.
A defesa do isolamento vertical, preferido por Bolsonaro e por um grupo de empresários e investidores, não tem grande adesão no eleitorado.
A pesquisa mediu também o índice de confiança no governo. A administração Bolsonaro recebe muita ou alguma confiança de 42% dos entrevistados. Já 52% declararam ter pouca ou nenhuma confiança na administração.
O melhor desempenho do presidente vem dos evangélicos (54%) e da Região Norte (58%). Os piores índices, com maior desconfiança, estão no Nordeste (58%), nas mulheres (60%) e nas pessoas com ensino superior completo (61%).
Esse é um raro indicador em que Bolsonaro melhorou na pesquisa. Em março, na última vez que esta pergunta constou do questionário, Bolsonaro havia obtido apenas 39% de confiança, ante 54% de desconfiança, o pior resultado dele na série histórica. Segundo Moura, porém, a variação é estável estatisticamente.
A pesquisa foi feita por meio de aplicativo de celular, com amostragem randomizada e respostas checadas para verificação de inconsistências.