O Povo, 04/11/2020. Versão on-line

Comida e água são direitos essenciais

Jaques Wagner


Na crescente lista de retrocessos, o aumento das desigualdades é o principal. Agora vemos sua face  mais perversa: a volta da fome e da sede, resultado do neoliberalismo que nos governa. Para os  especuladores, não falta dinheiro. Para os mais pobres, a ausência de comida e água é cada vez  mais sentida. Situação que tende a se agravar com o fim do auxílio emergencial. 

Segundo o Programa Mundial de Alimentos da ONU, reconhecido pelo Prêmio Nobel da Paz, a  estimativa é de que, com a pandemia, cerca de 5,4 milhões passem para a extrema pobreza,  atingindo, até o fim do ano, 14,7 milhões de brasileiros. 

As políticas de extinção dos estoques públicos de comida, das exportações desenfreadas e do  câmbio têm resultado na alta dos produtos. Um cenário que cobra medidas emergenciais para  recomposição da oferta de alimentos. A escassez incide de forma cruel sobre os mais vulneráveis e  reforça uma lamentável contradição brasileira. 

Para completar, o governo federal mandou suspender o trabalho de carros-pipa em 850 municípios  nordestinos, justo no período de seca. O programa é crucial. São 7 mil caminhões-pipa levando  água até 79 mil pontos coletivos de abastecimento. 

Apresentei no Senado projeto propondo ações para regularizar a oferta da dieta básica e garantir a  segurança alimentar da população. A iniciativa cria um cadastro de estoques e prevê que, nas safras  até 2022, os financiamentos de custeio e comercialização do arroz, feijão, mandioca e  hortigranjeiros, com recursos do Pronaf, terão taxa zero de juros. 

Também solicitei que o governo explique ao Congresso o porquê da redução de quase 24% no  orçamento das operações com carros-pipa, as razões técnicas para tais medidas e as novas  metodologias de abastecimento adotadas. 

Precisamos ter em conta que a pandemia agravou um quadro já difícil de desemprego e de redução  drástica na renda das famílias. O que se espera do governo nesse momento é que apoie os  brasileiros, com acesso a direitos básicos, como alimentação e água. Nos governos do PT,  reduzimos em 82%, entre 2002 e 2012, a população em situação de subalimentação e tiramos o  Brasil do Mapa da Fome. Não podemos retornar a um modelo onde quem tem muito lucre cada vez  mais e quem nada tem seja condenado a morrer de fome e sede. É de vidas que estamos falando.