Título: Dirceu, um cassado na ativa
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 02/12/2005, País, p. A2

Ex-deputado avisa que apoiará movimentos sociais e elogia Delúbio

Horas depois de ter perdido o mandato por 293 votos, o ex-deputado José Dirceu despediu-se da Câmara na tarde de ontem de forma inédita para um cassado: numa concorrida entrevista, cercado por dirigentes do PT, militantes e aliados.

Na entrevista de uma hora e meia, Dirceu afirmou que sua cassação foi ''uma violência'' e, mesmo sem projetos eleitorais, demonstrou que continua um ''animal político'' em plena atividade.

Mesmo com a fama de ter sido um superministro, fez questão de compartilhar com os demais auxiliares e com o presidente a responsabilidade pelo que se passou no governo.

- Nunca tive nem mais poder nem poder igual ao do presidente, tanto que ele me demitiu... Cometi erros com o PT, cometi erros com o governo, cometi erros com o presidente Lula - desabafou.

Dirceu chamou de ''mito'' a acusação de ter montado, no PT e no governo, um estrutura ilegal de arrecadação de fundos.

E provocou surpresa ao chamar de ''pessoa honesta'' Delúbio Soares, o ex-tesoureiro do PT responsável pela operação que distribuiu dinheiro entre os partidos aliados.

O petista prometeu continuar na militância política. O primeiro compromisso é hoje mesmo, num ato de apoio ao deputado João Paulo (PT-SP), em Osasco.

Na semana que vem, Dirceu começa a gravar depoimento para o escritor Fernando Morais, para um livro que, anuncia, não será ''chapa-branca''. Em janeiro, viaja aos EUA, para ficar com amigos por 60 ou 90 dias. Ao retornar ao Brasil, será sócio num escritório de advocacia.

O ex-ministro afirmou que não tem interesse em voltar ao poder.

-Já cumpri meu papel na vida política do país. Eu nunca olho para trás. Tenho que, com humildade, reconstruir a minha vida. Isso vai me custar anos. Vou atuar na vida política do país, dentro das minhas possibilidades. Vou participar do debate, vou apoiar os movimentos sociais. Não sou mais um homem público, sou um cidadão brasileiro. Não tenho mais poder nenhum - disse

Esbanjando um surpreendente bom humor, o homem que há cinco meses era considerado o nome mais importante do governo Lula - e acabou condenado por 293 colegas a perder o mandato - afirma que não almeja mais o poder dos tempos em que comandava a Casa Civil, de onde traçava os rumos da política.

- Tenho que ter consciência de que boa parte da opinião pública me condena - afirmou.

Durante a entrevista coletiva na tarde de ontem, em um plenário lotado de jornalistas, parlamentares e amigos, o ''animal político'' tentou demonstrar humildade.

- Preciso ter consciência de que boa parte da opinião pública me condena - afirmou.

Durante a entrevista coletiva na tarde de ontem, em um plenário lotado de jornalistas, parlamentares e amigos, o ''animal político'' tentou demonstrar humildade. Advogado, vai se dedicar aos trabalhos em um escritório em São Paulo e ao livro Trinta meses na Casa Civil, baseado em depoimentos que prestará a escritor Fernando Morais. Pediu desculpas pelo modo como tratou a imprensa nos tempos em que era ministro, mas acabou escorregando em alguns momentos.

- Li e ouvi todos os depoimentos e processos, acompanhei todas as CPIs todos os dias. Infelizmente não sou mais nem deputado, nem ministro, nem presidente do PT. Se eu fosse, seguramente a situação seria outra. Com perdão da falsa modéstia - afirmou. Logo depois pediu desculpas e retirou o que havia dito. - Foi excesso da minha parte, dado o cansaço e a emoção.

Dirceu foi presidente do PT até 2003, quando transmitiu o cargo para José Genoino. Apesar do pedido de desculpas, a declaração foi interpretada como uma referência ao escândalo do caixa dois que abalou a imagem política da legenda. Dirceu estaria, de novo, tentando negar a autoria de um esquema em que é tido como o principal artífice.