Valor Econômico, v. 20, n. 4975, 04/04/2020. Política, p. A8
Partidos cogitam postergar a eleição, mas rejeitam prorrogar mandatos
Malu Delgado
Presidentes dos maiores partidos brasileiros, consultados pelo Valor, rejeitam discutir, agora, um possível adiamento do calendário eleitoral e postergação do pleito municipal para depois de outubro. Todos, porém, admitem que é preciso reavaliar o cenário a partir de junho e tomar uma decisão racional, com base na curva de contaminação da covid-19 no país. A data limite dos partidos é 20 de julho, quando começam as convenções partidárias. Se até lá a crise da covid-19 ainda for grave, os dirigentes partidários enxergam possibilidade de construção de um consenso nacional pelo adiamento. Entre as possibilidades mais citadas nos bastidores está a realização do pleito em dezembro.
Já a prorrogação dos mandatos dos atuais prefeitos até 2022, para que sejam realizadas eleições unificadas, é uma tese rejeitada pela maioria.
Ainda que parlamentares já tenham apresentado propostas de emendas constitucionais (PECs) para alterar a data do pleito e o assunto seja recorrente nos bastidores, a prioridade total neste mês é votar medidas para coibir o impacto do coronavírus e somente em maio o tema eleições entrará oficialmente no debate.
“A prioridade é coronavírus. Claro que existe preocupação com a duração da crise. Vamos ter que analisar mais à frente o impacto disso. Somente nas convenções em julho vamos saber o impacto real. Antes disso é futurologia. Temos que trabalhar agora com calendário do TSE [Tribunal Superior Eleitoral]”, defendeu o presidente nacional do MDB, deputado federal Baleia Rossi (SP). Em 2016, o MDB elegeu o maior número de prefeitos do país, 1.026. Segundo Baleia Rossi, discutir a prorrogação de mandatos dos atuais prefeitos para 2022 por conta da pandemia não seria um debate honesto com a população.
O parlamentar salienta que, na última reforma política debatida no Congresso, foi favorável à unificação de eleições. “Com a tecnologia que temos, com confiabilidade de urnas eletrônicas e a capilaridade da Justiça Eleitoral, com organização nacional e amadurecimento político, não tem por que fazermos eleições de dois em dois anos. Agora, defendi isso lá atrás”, justifica.
O contexto, agora, afirma Rossi, é outro e bem diferente. “Não é simples. Temos a Constituição e ela tem que ser respeitada”, afirma Rossi, lembrando que a mudança das regras, durante o jogo, pode ser inconstitucional.
Também do MDB, a presidente da Comissão e Constituição do Senado, Simone Tebet (MS), alerta que a soberania popular, com escolha de representantes, é cláusula pétrea da Constituição. “O jogo de interesse é muito variado, daqueles que estão no poder e os que querem o poder. Não será fácil aprovar PEC com coincidência de mandatos. É muito mais provável uma postergação do pleito, talvez para novembro, dezembro”, argumenta Tebet. Esse assunto, no entanto, observa a senadora, “só vai ganhar força no Congresso em maio, quando tivermos maior clareza sobre o tempo que a pandemia vai durar”.
Para a presidente nacional do PT, deputada Gleisi Hoffmann, a discussão sobre o calendário eleitoral, neste momento de enfrentamento do coronavírus, é totalmente “extemporânea”. “Agora nosso foco é socorrer o povo brasileiro, focar nossas energias para garantir assistência à saúde e proteção à renda. Se e quando essa questão se colocar, discutiremos se será necessário alterar o calendário das eleições municipais”, justificou. A petista disse, ainda, temer que a crise do coronavírus seja “manipulada de forma oportunista” para dar lugar a “objetivos antidemocráticos”. Gleisi discorda frontalmente da prorrogação dos mandatos dos atuais prefeitos, o que seria um exemplo claro, explica, de afronta à democracia.
“Não temos ainda a dimensão da durabilidade dessa crise. As campanhas, oficialmente, só começam em agosto”, ponderou o presidente nacional do PSB, Carlos Siqueira. “Deus permita que daqui a quatro meses a gente possa sair dessa, mas a realidade pode nos impor um debate sobre o adiamento.” O PSB, segundo ele, sempre defendeu a unificação das eleições no Brasil, o que constava, inclusive, no programa de governo de Eduardo Campos em 2014, quando concorreu à Presidência. Essa tese, porém, não se aplica ao momento. “Tem que ser por economicidade. A unificação [dos pleitos] é uma medida racional, mas isso não pode ser definido no meio de uma crise sanitária”, observa. Se os parlamentares julgarem o debate oportuno, acrescenta Siqueira, que o façam para a próxima eleição, não alterando a durabilidade de mandatos que inicialmente eram de quatro anos.
“O PDT é radicalmente contra a prorrogação de mandatos. É casuísmo, beira a ditadura. Isso ajudaria Bolsonaro a estabelecer estado de sítio”, reage o presidente nacional da legenda, Carlos Lupi. “Um adiamento por 30, 60, 90 dias, dependendo da situação do país, é possível analisarmos adiante. Uma coisa é adiar as eleições. Outra é prorrogar mandatos”, defendeu Lupi.
Num segundo momento, com as ações mais claras para preservar a saúde e a economia, vamos entender melhor quanto tempo vai durar essa reclusão social e analisar até onde isso vai impactar o processo eleitoral”, afirmou. Bozzella considera razoável discutir apenas um adiamento. “A unificação [dos pleitos para 2022] seria ruim para o processo democrático não permitiria que pessoas participassem do pleito agora e nem a alternância de poder”, justificou.
A orientação do PSD, afirma Gilberto Kassab, presidente da legenda, é trabalhar com o atual calendário eleitoral. “Adiar por que? A não ser que tenhamos uma catástrofe, mas não é essa a expectativa.” Kassab pontua que a expectativa é que haja uma reversão da curva de contaminações após 40 dias. “É óbvio que se isso não acontecer vai se pensar em um outro caminho.” As direções nacionais do PSDB e do DEM também informam que seguem o calendário oficial. As siglas vão aguardar as convenções de julho para avaliar se será necessária alguma alteração. O Cidadania, presidido por Roberto Freire, é contra o adiamento do pleito e defende prioridade total ao combate da pandemia.